Ordem dos Advogados do Brasil vai pedir à Secretaria Estadual de
Segurança Pública dados sobre os autos de resistência e desaparecimentos;
anúncio foi feito pelo presidente da entidade, Felipe Santa Cruz, no
lançamento da campanha Desaparecidos da Democracia: Pessoas Reais, Vítimas
Invisíveis; sobre a ação, disse: "Não é só um ato de protesto, é um grupo
de trabalho que vai se reunir para elaborar propostas e dialogar com o Poder
Público"
Vinícius Lisboa, Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – A Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro
(OAB-RJ) vai pedir à Secretaria Estadual de Segurança Pública dados sobre os
autos de resistência e desaparecimentos, como a identidade dos policiais que
estiveram em confrontos que resultaram em mortes. O objetivo é criar um banco
de dados sobre o tema e preparar propostas de mudanças nos procedimentos
policiais. O anúncio foi feito hoje pelo presidente da OAB-RJ, Felipe Santa
Cruz, no lançamento da campanha Desaparecidos da Democracia: Pessoas Reais,
Vítimas Invisíveis.
"Não é só um ato de protesto, é um grupo de trabalho que vai se
reunir para elaborar propostas e dialogar com o Poder Público", disse.
"Queremos fazer um banco de dados com essa atuação multidisciplinar, e a
partir dele teremos propostas concretas em relação às ações da polícia, como
procedimentos de gravação, de acompanhamento de operações e procedimentos em
manifestações. Não é uma tentativa de criminalizar as polícias ou as
autoridades públicas, é, a partir do movimento que começou com as UPPs
[unidades de Polícia Pacificadora], construir a polícia cidadã que nós
esperamos".
O trabalho será feito pelo tesoureiro e diretor da OAB-RJ, Luciano
Bandeira; pelo diretor da Comissão de Direitos Humanos do órgão, Marcelo
Chauréo; e pelo sociólogo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Michel
Misse; cuja pesquisa sobre autos de resistência contabilizou, entre 2001 e
2011, 10 mil mortes sob suspeita de confronto com a polícia no estado do Rio.
De acordo com Misse, dos 707 autos registrados na capital em 2005, 355
tiveram inquéritos instaurados e 19 chegaram ao Tribunal de Justiça até o fim
de 2007, com 16 arquivamentos e uma condenação.
"Não estou afirmando que eles foram mortos sem confronto, estou
dizendo que não sabemos o que aconteceu. Precisamos melhorar a qualidade dos
registros. Não se trata de acusar, temos que melhorar o sistema de Justiça
Criminal. Para isso, temos que nos indignar com esses números. Se acharmos isso
normal, estamos fora da curva do mundo civilizado", defendeu o sociólogo.
Depois de criar o banco de dados, a campanha entrará na segunda etapa,
que é a de cruzar as informações e ouvir depoimentos de parentes de vítimas e
desaparecidos, para então chegar a elaboração de propostas. Um ponto, já
defendido pelo diretor de Direitos Humanos da OAB, é a regulamentação do crime
de desaparecimento forçado no Brasil, que ele considerou uma "prática
repressiva de estados de Exceção, que se manteve mesmo com o fim da
ditadura".
Representando o grupo Mães da Cinelândia, Regina Célia da Rocha Maia,
que teve a morte do filho registrada como auto de resistência há 17 anos,
defendeu que seja cumprida a recomendação da Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República de não usar mais o termo, e sim "lesão corporal decorrente
de intervenção policial" ou "morte decorrente de intervenção
policial". "Essa campanha é uma vitória para nós [mães], uma vitória
pela dor, mas uma vitória. Somos todas invisíveis, as portas estão sempre
fechadas para nós e nossos filhos continuam a ser chamados de bandidos, por
mais educação e dignidade que tenhamos dado".
Integrante da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência,
Maurício Campos dos Santos disse que a principal vítima é jovem, negro, do sexo
masculino, de baixa escolaridade e morador de áreas pobres. "Não é uma
realidade só do Rio de Janeiro, é uma realidade nacional, e outros estados têm
uma situação até mais grave proporcionalmente", disse.
Procurada por e-mail, a Secretaria de Segurança Pública ainda não se
manifestou sobre a campanha.
Edição: Carolina Pimentel