domingo, 28 de julho de 2013

Folha de São Paulo: Com declínio de Eike, agricultores pedem terra desapropriada de volta no porto de Açu, no RJ


RAQUEL LANDIM, ENVIADA ESPECIAL A SÃO JOÃO DA BARRA (RJ)

Silvana de Alvarenga Barreto enxuga as lágrimas e empertiga-se na poltrona estreita depois de contar que o marido faleceu no dia 5 de maio, logo depois de completarem 29 anos de casados.

Ela está convicta de que Aloísio Barreto "morreu de tristeza" por causa das complicações da depressão que o atormentou desde 2011, quando perdeu suas terras.

"O progresso sempre mexe com alguém, mas aqui só trouxe desgraça. Faz dois anos que tomaram a terra e não fizeram obra nenhuma", diz Assis, filho do casal.

A indignação de Assis é a mesma da maioria das cerca de 300 famílias que tiveram as terras desapropriadas para a construção do complexo industrial do porto do Açu, no norte do Rio de Janeiro, o projeto mais ousado do empresário Eike Batista.

Dos 70 quilômetros quadrados --7.000 campos de futebol-- desapropriados pela Companhia de Desenvolvimento do Rio de Janeiro (Codin), vinculada ao governo do Estado, só 10% estão ocupados por obras.

Editoria de Arte/Folhapress

A desapropriação, no entanto, está quase completa. Das 466 propriedades, 420 foram desocupadas, algumas com ajuda da polícia. Há na área várias casas demolidas e terrenos cercados com placas como "Propriedade privada da LLX", "Propriedade privada da Codin" e "Não ultrapasse". A LLX opera o porto.

Com a derrocada de Eike, atolado em dívidas, os agricultores querem as terras de volta. As lideranças rurais preparam com auxílio de advogados uma ação popular, que vai pedir à Justiça a reversão das desapropriações por "desvio de finalidade", já que pouca coisa saiu do papel até agora.

O projeto de Eike previa a instalação de siderúrgica, cimenteiras, termelétrica, um polo metal mecânico, um polo ferroviário, entre outras empresas. Eike chegou a dizer que a negociava a vinda de uma fábrica de produtos da Apple para o Açu.


OUTRO LADO

Por meio de nota, a Codin informou que "o desvio de finalidade não procede, porque já existem empresas entrando em funcionamento e outras em fase de obras".

O órgão ressaltou que, para mitigar os impactos sociais, reassentou pequenos agricultores e paga um auxílio produção aos demais.

A LLX não comentou a possível ação. Diz que a área adjacente ao porto é importante para evitar que a cidade cresça em seu entorno, criando gargalos logísticos como há, por exemplo, em Santos. Ela prevê que toda a área do complexo esteja ocupada em 2030.