terça-feira, 30 de julho de 2013

Conceição do Mato Dentro: Os “órfãos” do progresso

Jovens mães embalam bebês de trabalhadores que somem após obras


O pai de João Miguel, do Ceará, foi embora logo após saber que Jaqueline estava grávida

ANA PAULA PEDROSA, PEDRO GROSSI E QUEILA ARIADNE


Conceição do Mato Dentro. Em 2008, quando o megaempresário Eike Batista embolsou cerca de US$ 5 bilhões pela venda do projeto de exploração de minério de ferro Minas-Rio para a sul-africana Anglo American, nascia na periferia da cidade de Conceição do Mato Dentro, na região Central do Estado, o pequeno Eike Lima da Conceição.


A mãe, Aline de Souza Lima, então com 19 anos, conheceu E.M.C., o pai da criança, durante uma festa de confraternização dos empregados da empreiteira que lotavam a cidade, vindos de todos os cantos do Brasil, para trabalhar no megaempreendimento de instalação da usina de extração de minério.

Enquanto Eike, o empresário, multiplicava sua fortuna virtual convencendo investidores a financiar o projeto X, Eike, a criança, se mudava com a mãe para o Espírito Santo à procura do pai. “Durante um mês, o meu filho teve pai, mas nem deu tempo de registrar”, conta Aline. Mas voltaram para Conceição do Mato Dentro, quando ela descobriu que sua amiga estava grávida de seis meses da Rosa, irmã paterna do Eike.

De outro relacionamento com um morador da cidade nasceu Enzo Gabriel. O caçula, hoje com sete meses, Eike e Aline são sustentados por Rônio Junior dos Santos. O jovem, de 19 anos, saiu do município de Presidente Kubitschek, também na região Central, para se juntar aos 4.000 empregados que trabalham na instalação do projeto Minas-Rio, empreendimento que já consumiu mais de US$ 30 bilhões e que é o maior investimento mundial da Anglo American.

“Hoje eles são meus filhos, apesar do Eike não me aceitar muito bem em casa, mas não sei o que vai acontecer com a gente no futuro. Meu contrato acaba em seis meses, e não sei o que vou fazer depois disso”, diz o atual chefe da casa.

Pobreza e Mágoa

 A três quarteirões da casa do pequeno Eike, no bairro pobre de Córrego Pereira, Vaílde da Conceição, de 21 anos, embala o pequeno Diogo, de 8 meses. Sem sequer um berço, o bebê dorme em um sofá velho – praticamente só a estrutura de madeira –, em um dos três únicos cômodos da casa. O pai da criança conheceu Vaílde por meio de uma ex-namorada, Renata. Trabalhador “daquela empresa grande que veio pra cidade”, ele era um dos mais cobiçados nas festas e nos encontros promovidos pelos funcionários.

“Ele me prometeu um monte de coisa e fugiu me deixando sem nada”, reclama Vaílde. Cadastrada em programas sociais do governo federal, ela depende dos R$ 80 mensais do bolsa-creche para sustentar o filho.

Casos como os de Eike e Diogo são um dos efeitos colaterais de grandes obras em cidades pequenas. Trabalhadores vêm de fora e, ao fim do contrato, vão embora, deixando para trás órfãos de pais vivos.