quinta-feira, 9 de maio de 2013

Além do Maracanã: grupo de Eike Batista enfrenta polêmicas e crise

Empresas de Eike enfrentam crise. Foto: Getty Images

A vitória do consórcio Maracanã S.A. no processo de licitação para a gestão do Complexo do Maracanã pelos próximos 35 anos, anunciada nesta quinta-feira, colocou em evidência a atuação das companhias do grupo EBX, do empresário Eike Batista, que nos últimos meses vêm enfrentando uma forte queda em seu valor de mercado e polêmicas em relação a alguns de seus principais empreendimentos.

A participação da empresa IMX - do conglomerado de Batista - no consórcio vencedor foi alvo de críticas de ativistas e do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, que, antes da licitação, ingressou com uma ação na Justiça questionando o fato de empresa ter sido responsável pelo estudo de viabilidade do estádio.

No entender dos promotores, isso poderia dar uma vantagem "indevida" ao grupo.

Sob este argumento, o MP chegou a obter uma liminar na Justiça suspendendo a licitação. A liminar, no entanto, foi cassada horas antes do início da disputa, o que possibilitou a abertura dos envelopes de propostas no último dia 11 de abril.

Em nota enviada à BBC Brasil, a empresa afirmou que agiu em "observância de toda a legislação aplicável". Especializada em negócios nos setores de esporte e entretenimento, a IMX é uma das 13 companhias do conglomerado de Batista, dono de um império reunindo empresas que vão desde petróleo e gás a restaurantes e hotéis, passando por mineração, logística e construção naval.

A BBC Brasil elencou os principais pontos das polêmicas envolvendo Batista e suas empresas. 
Confira abaixo.

Queda das ações
Apesar da pujança, os negócios de Batista vêm passando por um momento delicado. De acordo com a revista Forbes, o patrimônio do empresário, que era estimado em US$ 30 bilhões (R$ 60 bilhões) no ano passado, caiu para US$ 10,6 bilhões (R$ 21,2 bilhões) neste ano.
Um levantamento elaborado pela consultoria Economática aponta quedas expressivas nos valores das ações das empresas de Batista nos últimos tempos. Entre 2010 - quando foram lançadas no mercado por meio de um IPO (oferta inicial de ações) - e a última terça-feira (7 de maio), as ações da empresa de construção naval OSX, por exemplo, se desvalorizaram em 90,9%.

Já as ações da petroleira OGX, carro-chefe do chamado 'grupo X', caíram 82,8% entre 2008 e 7 de maio de 2013. "É uma crise generalizada de confiança", afirma Sérgio Lazzarini, professor de Organização e Estratégia do Insper, de São Paulo.

"Houve um excesso de expectativa positiva desde quando essas empresas foram lançadas em bolsa", acrescenta. "Aí, o mercado começou a receber notícia ruim atrás de notícia ruim, o que acabou questionando a habilidade de gerar valor do grupo como um todo."

Em mais uma tentativa de solucionar a crise, a OGX - que teve em 2012 um prejuízo líquido de R$ 1,2 bilhão - anunciou na última terça-feira a venda de 40% do campo de Tubarão Martelo, na Bacia de Campos, à petroleira malaia Petronas, em uma transação de US$ 850 milhões, condicionada ao volume de produção. Ainda segundo a empresa, a Petronas teria demonstrado interesse em comprar 5% da OGX no futuro.

A notícia foi bem recebida pelo mercado em um primeiro momento, com uma forte valorização das ações da OGX na Bovespa na manhã da quarta-feira. No final do dia, no entanto, os papeis despencaram novamente.

Ajuda estatal
Enquanto a crise no grupo daquele que já foi considerado o homem mais rico do Brasil não chega ao fim, começaram a surgir rumores na imprensa de que o governo federal estaria se preparando para ajudar as empresas de Batista.
Relatos davam conta de que o Planalto temeria que uma eventual quebra das companhias poderia afetar a credibilidade do Brasil e comprometer investimentos. Bancos que teriam feito empréstimos ao grupo também estariam preocupados.

Os boatos sobre a ajuda estatal alimentaram críticas a respeito das supostas ligações de Batista com o governo. "Eu acho que o grupo Eike Batista é uma criação do governo do PT. Porque as concessões que foram feitas a ele criaram um valor fictício para esses recursos", disse à BBC Brasil o economista Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES (2003-2004) e professor emérito da UFRJ.
Entre os bancos que financiaram o grupo de Eike está o próprio BNDES. De acordo com a assessoria de imprensa do banco de fomento, o grupo EBX contratou R$ 10 bilhões em financiamentos junto ao BNDES entre 2005 e 2012. Segundo o banco, os valores desembolsados ou já quitados não podem ser divulgados devido à legislação de sigilo bancário.
O grupo, no entanto, nega que suas dívidas com o BNDES o deixem em situação delicada. Segundo a EBX, a exposição de crédito direta do banco com o grupo é de R$ 109 milhões. A EBX diz ainda que sua situação é "extremamente confortável" e nega qualquer favorecimento, dizendo que os recursos do BNDES são tomados e "pontualmente pagos nas mesmas condições oferecidas a todo o mercado, passando por criteriosa análise do banco de fomento".

Risco
Autor de diversos estudos sobre as relações entre o Estado e o capital privado, Sérgio Lazzarini diz ver com "restrições" a eventual ajuda estatal ao grupo de Batista. "Eu acho em geral muito problemático o Estado entrar em associação com conglomerados com várias unidades", diz o professor do Insper, que afirma que, em grupos desse tipo, há sempre a tentação de se usar nas empresas em crise recursos de outras unidades, o que pode gerar um "risco sistêmico".

Lazzarini também rebate o argumento de que uma eventual quebra do grupo possa gerar desconfiança internacional quanto ao ambiente de negócios do Brasil, o que justificaria a ajuda governamental. "Pelo contrário, eu acho que mais ações de resgate no Brasil vão sinalizar que aqui nós temos um ambiente pouco transparente para os negócios", diz.

O economista Carlos Lessa concorda. "Por esse argumento, você teria fórmulas para impedir que qualquer grande grupo passasse por qualquer problema, dando uma espécie de impunidade aos grandes grupos".

Petrobras
Os rumores sobre a suposta ajuda estatal às empresas de Eike Batista não se restringem ao BNDES. Em março, começaram a surgir informações de que a Petrobras poderia passar a utilizar as instalações do Superporto do Açu, complexo portuário do grupo EBX localizado em São João da Barra (RJ) e que deve ser inaugurado ainda neste ano. A medida foi interpretada por alguns analistas como uma espécie de auxílio velado ao grupo às custas da estatal.

Em declarações à imprensa, a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, confirmou que negociações estão sendo conduzidas, mas negou que se trate de uma ajuda ao grupo de Eike Batista. "É um negócio, não se trata, definitivamente, de ajuda", disse Graça, segundo a Agência Brasil.

Lessa afirma que a construção do Porto do Açu é "importante para o Brasil e não deve ser adiada", mas diz não ver razão para que o grupo seja "beneficiado por esse socorro". "Eu acho que se a ajuda vier, o que o governo brasileiro deveria fazer é passar o ativo do Porto do Açu para a Vale e para a Petrobras", diz o ex-presidente do BNDES. "O que o governo deveria fazer é simplesmente expropriar o porto pela dívida".

Já Lazzarini afirma que, se houver interesse comercial da Petrobras no Porto do Açu, cabe à empresa demonstrar que a parceria poderia ser vantajosa.

Por meio de sua assessoria, a EBX afirmou que ela e a Petrobras são "dois grupos brasileiros com grande potencial de parceria", mas que "não há no momento, nenhum negócio firmado a ser comunicado".

Procurada pela BBC Brasil, a Petrobras afirmou que "não tem participação na construção do Porto de Açu, mas está em busca de contratos para usar infraestruturas como a que o Grupo X está construindo". A petroleira afirmou ainda estar "fazendo uma avaliação no mercado para ver quem cobra a menor tarifa com maior confiabilidade para contratar prestação de serviços".

Ambiente e estrutura
Além de dúvidas quanto à participação da Petrobras no Porto do Açu, o projeto enfrenta ainda outras polêmicas. Em fevereiro, a empresa OSX foi multada em R$ 1,3 milhão pelo Inea (Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro) por danos ambientais causados pelo processo de ragagem para a construção do complexo.

Segundo o Inea, as obras teriam provocado o aumento da salinidade das águas de um canal usado como fonte abastecimento por agricultores da região. A empresa está recorrendo da multa, afirmando que o aumento da salinidade foi um evento "pontual, transitório e reversível" e que já foram identificadas "evidências técnicas de retorno à normalidade".

Mas o projeto do "superporto" sofreu ainda outro golpe. No início de abril, as ações da LLX, braço logístico do grupo, tiveram uma queda acentuada depois de a revista Veja ter afirmado que as obras do porto teriam sido feitas sem estudos de solo e agora correriam risco de ruir.

A empresa, no entanto, negou as acusações, afirmando serem "inverídicas e infundadas" e dizendo não haver nenhum problema estrutural nas obras.

Marina da Glória
Para além das bolsas de valores e do Porto do Açu, o grupo EBX também enfrenta polêmicas na cidade escolhida por Eike Batista para ser sede de seu império: o Rio de Janeiro. Talvez a maior delas envolva o projeto de reforma e modernização da Marina da Glória.

Localizada no Aterro do Flamengo, que foi tombado pelo Iphan em 1965, a Marina da Glória é administrada em regime de concessão pela empresa REX, do grupo EBX. Após dois anos de tentativas, a companhia apresentou no ano passado um anteprojeto de reforma da marina, que foi aprovado pela Comissão de Análise de Recursos do Iphan em fevereiro. Atualmente, o órgão analisa o projeto executivo da obra.

O projeto de modernização da marina prevê um centro de convenções e exposições com capacidade para 900 pessoas, a ampliação no número de lojas e vagas de estacionamento, além da abertura de áreas ao ar livre para uso do público.

A proposta, no entanto, vem sendo alvo de críticas. Uma petição publicada na internet vem coletando assinaturas contra o projeto. Até o início da tarde de quarta-feira, mais de 11,7 mil pessoas já haviam se manifestado contra a reforma da Marina.

"(O projeto) é muito pouco transparente. Nós não tivemos as audiências públicas", diz o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), um dos responsáveis pelo abaixo-assinado. "O projeto prevê a construção de um shopping e a construção de um estacionamento para 700 carros, o que altera muito todo o fluxo de veículos, todo o fluxo de pessoas." "É preciso que você tenha estudo de impacto, que tenha um debate com o conjunto da sociedade, porque ali envolve interesse público, e isso até agora não aconteceu", acrescenta Freixo.

Para o deputado, o projeto da Marina da Glória não pode ser pensado de modo separado do resto do Aterro do Flamengo. "Aquilo é um parque público, foi feito e precisa ser entendido como um todo."

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da REX afirmou que a aprovação do anteprojeto é o "primeiro passo de um trâmite no qual outros órgãos competentes e a comunidade serão envolvidos". A empresa diz que já vem mantendo reuniões com entidades profissionais e civis e que serão realizadas apresentações públicas. Dizendo que a marina será um equipamento que "poderá ser efetivamente utilizado por todos", a empresa confirma a ampliação do número de lojas, mas nega planos para a implementação de um shopping. Ainda de acordo com a REX, os impactos no trânsito não afetarão o tráfego da região.