27 de outubro de 2011, campus da USP
O conflito direto do dia 27 de outubro, na Universidade de São Paulo (USP), foi o estopim de um movimento e da ocupação do prédio de Administração da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, contra a presença militar no campus. Caio Melo, estudante de Filosofia e estagiário da Carta Maior, estava lá. Ele relata a sua experiência numa cena de conflito estudantil: de um lado, manifestantes; do outro lado, um contingente policial armado até os dentes.
No dia 27 de outubro, a Polícia Militar invadiu o prédio da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo. Durante todo o dia foram identificados e revistados alunos que andavam ao redor da faculdade. Já no fim da tarde, depois de enquadrados três alunos que faziam uso de maconha e retidos seus documentos, os grupos de estudantes que cercavam o prédio passaram a se juntar numa manifestação contra a presença militar.
Os policiais que abordaram os três jovens eram da ROCAM, a Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas, criada em 1982 pelo 1º Batalhão de Polícia de Choque (ROTA) da Polícia Militar. Os estudantes reagiram à invasão do prédio. Quanto mais se espessava a manifestação contra a ação da PM no campus, mais se acirrava o conflito: chegaram reforços da Força Tática e policiais militares sem identificação. Depois de algumas horas, um grupo foi chamado para negociar com os estudantes detidos. A diretora da FFLCH, Sandra Nitrini, e o advogado dos estudantes conversaram sobre a abordagem e negociaram para que os alunos fossem poupados de processos administrativos, que viraram praxe na gestão do reitor José Grandino Rodas.
O conflito direto do dia 27 foi o estopim de um movimento e da ocupação contra a presença militar no campus. Caio Melo, estudante de Filosofia e estagiário da Carta Maior, estava lá. Ele relata, no texto abaixo, a sua experiência numa cena de conflito estudantil: de um lado, manifestantes; do outro lado, um contingente policial armado até os dentes.
Dia 27 de outubro de 2011, campus da USP
Por Caio Mello
Cheguei no horário de costume, eram cinco e meia da tarde. Fui jantar no Restaurante das Ciências Químicas e um dos amigos que me acompanhavam recebeu um telefonema. Eu ouvi: "A polícia tá no campus" Sai de perto daí". Chegamos, o estacionamento estava iluminado pelas sirenes vermelhas das viaturas; havia muitos soldados, armamento pesado. ROCAM, Força Tática e policiais militares. Os estudantes gritavam contra a presença militar, discutida desde antes do convênio com a USP, assinado em setembro, mas já aprovado desde agosto.
Cinco ou seis policiais com capacetes estavam rodeados pelos alunos indignados. Nesse rebuliço, outras viaturas e policiais (alguns sem identificação) com as tais armas mais pesadas. A discussão se estendeu por mais de duas horas. Os estudantes gritavam. Os policiais ouviam as alegações dos estudantes, mas permaneceram irredutíveis - queriam levar os jovens para a delegacia. Estava decidido. Os documentos dos três alunos - que foram, supostamente, pegos com maconha - foram retidos e só seriam devolvidos depois da ida e esclarecimento na delegacia.
Depois deste período, foram chamados o advogado do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e a diretora da FFLCH, Sandra Margarida Nitrini, para conversarem com os estudantes detidos. Este seria o ponto de maior tensão. Já era por volta 8:30 da noite, quando levaram os alunos para uma das salas do Prédio do Meio, de Filosofia e Ciências Sociais. Sete ou oito policiais militares entraram no prédio sem identificação, com bombas nas mãos e foram em direção da sala onde os alunos estavam - sala 100. A entrada da PM desencadeou um coro de repúdio, pedindo a saída imediata do edifício. Estavam no primeiro andar, que dá para o estacionamento junto à História e Geografia).
Os policiais diziam aos estudantes mais próximos: "É melhor vocês saírem daqui, vocês vão se machucar". Os alunos reagiram aos gritos, pedindo a saída dos policiais. Saíram. Quando o último PM deixou o prédio, o conflito se alastrou entre os próprios estudantes. DCE, movimentos partidarizados, grupos de extrema-esquerda discutiam e xingavam um a conduta do outro; o DCE continha a passagem. Alguns poucos alunos radicais gritavam pela mobilização enérgica contra a polícia e a entrada na sala da negociações.
Foi então que um dos três alunos que foram a razão do conflito saiu e comunicou aos colegas que iriam à delegacia para rever os documentos apreendidos e para não sofrerem punições administrativas. Quando foram em direção da viatura, para finalmente se dirigirem até a Delegacia, houve o confronto: os alunos seguiram os policiais. Esbarrões e gritos mais altos. Os alunos empunhavam livros e gritavam. Os policiais cacetetes e armas. Os estudantes jogaram um cavalete contra a polícia, que reagiu. Foi aí que a violência começou efetivamente. Um estudante foi atingido no supercílio.
Os estudantes mais revoltosos jogaram pedras nas janelas dos veículos e deram chutes. O conflito se intensificou. A polícia usou as bombas e gás lacrimogêneo. Os alunos dispersaram-se. Alguns foram feridos. A maioria atingida pelo gás que nos ardeu os olhos. Com a dispersão, as viaturas foram para a delegacia com os três alunos, outros conhecidos e envolvidos das negociações.
Dez e meia. Fez-se uma assembleia com grande parte dos que estavam desde a abordagem policial, no fim da tarde. Decidiu-se pela invasão, por nove votos, do prédio de Administração da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. A ocupação começou imediatamente.