sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Mesmo com alerta, ministério permitiu venda de agrotóxico

REYNALDO TUROLLO JR.
DE SÃO PAULO

O Ministério da Agricultura autorizou a venda de um agrotóxico mesmo após ter sido informado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de que o produto estava irregular e poderia causar danos à saúde.

Para ser comercializado, um agrotóxico precisa passar por avaliações simultâneas na Anvisa (que mede os efeitos na saúde humana), no Ibama (dano ambiental) e no próprio Ministério da Agricultura, que avalia a eficácia agronômica e dá o registro.


De 17 a 20 de setembro deste ano, a Anvisa enviou dois ofícios ao Ministério da Agricultura avisando que o Informe de Avaliação Toxicológica (IAT) do inseticida Diamante BR, da Ourofino Agronegócios, estava suspenso.

Apesar disso, em 26 de setembro, o Ministério da Agricultura publicou no "Diário Oficial da União" a concessão do registro para o produto.

A suspensão do IAT ocorrera porque o inseticida não havia passado pela avaliação da Anvisa. Ofício da agência foi enviado ao coordenador da área de fiscalização de agrotóxicos da Agricultura, Luís Eduardo Rangel.

O ministério afirmou, via assessoria, que somente soube do ofício da Anvisa no mês seguinte, pois ele tramitara "via protocolo".

A Folha, porém, obteve documento que mostra que Rangel recebeu um dos ofícios, em mãos, em 17 de setembro --papel que foi assinado e datado por ele. Confrontado com a cópia do documento, o ministério mudou de versão.

Duas semanas depois, ao notar que o agrotóxico estava no mercado, a gerência de toxicologia da Anvisa enviou novo ofício ao ministério.

"Reiteramos a necessidade de imediata suspensão do registro do produto [...] que pode trazer riscos inaceitáveis à saúde de trabalhadores, de consumidores e da população", diz o documento. A Agricultura proibiu a venda só nove dias mais tarde.

O produto ficou à venda irregularmente, com o aval do ministério, por três semanas.

O gerente-geral de toxicologia da Anvisa que enviou os três ofícios ao ministério, Luiz Carlos Meirelles, é o servidor que identificou as irregularidades e as denunciou à presidência da agência.

Na semana passada, Meirelles foi exonerado, como informou o jornal "O Globo".

A direção da Anvisa nega que a exoneração tenha ocorrido em decorrência dessas investigações.

Meirelles trabalhou por 12 anos na Anvisa. A direção da agência emitiu nota criticando sua "demora" para agir.

OUTRO LADO

O Ministério da Agricultura afirmou inicialmente que demorou até 17 de outubro para proibir as vendas do agrotóxico porque "a comunicação oficial da Anvisa tramitou via protocolo e foi recebida pela área técnica em 15 de outubro".

Após ser confrontado com o documento que mostra que, em 17 de setembro, seu servidor já havia sido pessoalmente avisado da irregularidade, o ministério mudou a versão.

"Por se tratar de um caso inédito, nós o encaminhamos à nossa assessoria jurídica. Quando o caso retornou, em 15 de outubro, publicamos a suspensão das vendas."

À Folha, o coordenador da fiscalização de agrotóxicos da pasta, Luís Eduardo Rangel, disse que pode ter havido "má coordenação das tramitações burocráticas".

"Pode ser que a tramitação para publicação do registro no 'Diário Oficial' já estivesse em andamento quando esse documento estava vindo da Anvisa", afirmou.

A direção da Anvisa disse anteontem que fará auditoria em todos os processos de avaliação de agrotóxicos de 2008 até novembro de 2012. O órgão informou um total de 796.

A empresa Ourofino, fabricante do Diamante BR, diz que "cumpre rigorosamente todos os procedimentos exigidos pela legislação".