A população de Conceição do Mato Dentro (Região Central do Estado) quer a paralisação do projeto Minas-Rio, desenvolvido pela mineradora Anglo American na cidade. As denúncias dos prejuízos econômicos, sociais e ambientais provocados pelo empreendimento foram abordadas em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta sexta-feira (5/7/13), no município.
“Queremos a paralisação já”, resumiu o representante do Movimento dos Atingidos de Conceição do Mato Dentro, Lúcio Guerra Júnior, aclamado por moradores que lotaram o plenário da Câmara Municipal, onde foi realizada a reunião. “A hora é agora, que venha para a audiência o representante da mineração, o secretário de Meio ambiente”, provocou o representante do Movimento Pelas Serras e Águas de Minas, Gustavo Tostes Grazzinelli, dirigindo sua fala ao presidente mundial da empresa que estava na cidade, visitando o projeto.
Dentre as denúncias apresentadas pelos convidados, estão a de grilagem de terras, assoreamento de córregos e rios, coação da população e destruição do meio ambiente. Todos também reclamaram que não conhecem o processo de licenciamento da empresa. “Um empreendimento que tem 340 condicionantes não pode ser coisa boa”, ironizou o presidente da comissão, deputado Durval Ângelo (PT).
A deputada Luzia Ferreira (PPS) lembrou que as denúncias já foram objeto de audiência pública da comissão, em maio, em Belo Horizonte. E reclamou que nenhuma resposta foi apresentada pela empresa ou pelo governo acerca dos requerimentos que foram encaminhados solicitando informações. Ela defendeu a pressão da população para que seja dada uma solução ao problema, lembrando da força das manifestações que assolaram o País e destravaram projetos que estavam há anos no Congresso. "Defendo o desenvolvimento, a geração de emprego, mas é preciso que as empresas tenham responsabilidade social e ambiental. É preciso pensar no ser humano em primeiro lugar".
O deputado Rogério Correia (PT) e o deputado federal Padre João (PT-MG) também estimularam manifestações e protestos contra as atividades e os abusos da mineradora. "Ou se faz um movimento real, ou os problemas vão se tornar ainda maiores", advertiu Correia. "É preciso ir às ruas e pautar questões como estas", completou Padre João.
Anglo American é acusada de promover invasões ilegais e ameaçar proprietários de terras
Lúcio denunciou que a empresa invade propriedades, impede moradores de entrarem em suas próprias terras, exerce coação para que outros vendam suas propriedades. A professora aposentada Maria das Graças Drummond Andrade denunciou que a empresa invadiu parte de seu sítio Quinta Vista Bela, no município de São Domingos do Prata, e provocou erosões e danos na propriedade, desvalorizando-a. Em 14 maio, segundo ela, 25 caminhões e 15 seguranças da mineradora invadiram seu sítio, ameaçando se apropriar de uma área ainda maior. Ela contou que conseguiu o apoio da polícia para impedir a invasão.
A moradora Rita Rodrigues denunciou que a empresa comprou propriedades vizinhas a seu sítio e os seguranças estão impedindo-a de entrar na própria casa. Diante da denúncia, o deputado Durval Ângelo solicitou à Polícia Militar e ao representante do Ministério Público que seja assegurado a ela o direito de ir e vir.
Segundo a professora da PUC-MG, Denise de Castro Pereira, muitas outras invasões já foram registradas. Ela lamentou o descuido, também, com o espaço público. Segundo ela, um campo de futebol está sendo usado como estacionamento pela empresa. Outros moradores reclamaram de indenizações muito abaixo dos valores dos imóveis. Foi geral, também, a reclamação contra a convivência dos órgãos ambientais e do próprio Estado a favor da multinacional.
O advogado da empresa, Rodolfo Luiz Xavier Virgílio, negou todas as informações. Abaixo de vaias, ele assegurou que não há grilagens e que todas as propriedades foram compradas pela empresa de maneira legal. O deputado Rogério Correia afirmou que há denúncias de que a mineradora adquiriu propriedades da MMX que foram comprados de maneira suspeita por uma empresa “laranja”, a Borba Gato que se passava por uma empresa supostamente agropastoril.
Rogério Correia afirmou que denúncias semelhantes às relatadas em Conceição do Mato Dentro são recorrentes em todas as cidades onde há a atividade de mineração. "A mineração virou atividade sem lei", desabafou. Segundo ele, o empreendimento da Anglo American foi aprovado pelo governador Aécio Neves, para "agradar" o então responsável pelo projeto na época, o empresário Eike Batista, e o atual vice-governador Alberto Pinto Coelho, cuja base política é no município. "Passam por cima de todos esses problemas em nome de interesses políticos", acusou.
Participantes fazem relatos de danos provocados na cidade
Auditório Câmara Municipal de Conceição de Mato Dentro - Foto: Alair Vieira
O secretário municipal de Meio Ambiente, Sandro Heleno Lage da Silva, fez uma comparação entre as condições da cidade atualmente e como era há seis anos, antes da implantação da Anglo American. “Antes tínhamos um aterro sanitário controlado, hoje temos um lixão a céu aberto; antes tínhamos muitas unidades de conservação e hoje estão sendo depredadas. É preciso uma força-tarefa para salvar Conceição”, disse ele.
“Este é um projeto satânico, do capeta”, esbravejou o frei Gilvander. Ele citou um versículo da bíblia, “o espírito de Deus paira sobre as águas”, para acusar a Anglo American de estar cometendo um pecado capital. “Estão dizimando as águas e pisando na cidade”, condenou.
A poluição dos mananciais de água da cidade também foi lamentado pelo promotor de Justiça da Comarca de Conceição do Mato Dentro, Marcelo Mata Machado Leite Pereira, que considerou este dano de valor intangível. “Não se pode mais tomar banho no rio. E isso está marcado no coração de cada uma dessas pessoas que está aqui”.
Marcelo Leite afirmou que o Ministério Público tem tentado, sem sucesso, resolver o problema. Já ajuizou ações contra o licenciamento de operação, contra o fracionamento das licenças e, no ano passado, conseguiu, liminarmente, suspender por seis meses o projeto. Lamentou que no Tribunal de Justiça, no entanto, as ações foram derrotadas.
O promotor afirmou que a cidade não está preparada para receber o projeto minerário. Mais de 8 mil pessoas chegaram à cidade para trabalhar na empresa – o que pode ser notado nas ruas pelo expressivo número de pessoas usando o uniforme da mineradora. Segundo Marcelo Leite, em função do excesso de pessoas, houve piora nos serviços públicos, como do hospital. “A desordem urbana é total”, reclamou. A presidente da Câmara, vereadora Ivete Santa Bárbara, também confirmou que os cidadãos atingidos pelo projeto não estão vendo respeitados seus direitos fundamentais, como a integração física e moral - aludindo às ameaças e desmandos da empresa que foram denunciadas na reunião.
A delegada da cidade, Helena Torumi Viana Mata, reforçou a ideia do despreparo da cidade. Segundo ela, após a instalação da empresa, os aluguéis residenciais apresentaram uma alta descontrolada de preços, prejudicando a população. Ela citou alguns policiais, tanto civis quanto militares, que estão sendo despejados porque já não conseguem pagar os valores. Ela citou um incidente ocorrido quarta-feira (3/7), quando operários queimaram galpões da empresa que eram usados como dormitórios. Segundo ela, a polícia não reagiu contra os manifestantes, mas foi recebida a pedradas. Os responsáveis pelo incêndio estão sendo investigados.
Código minerário - O deputado Durval Ângelo lembrou que é preciso que a população se mobilize contra o Projeto de Lei 5.807, que tramita no Congresso Nacional em regime de urgência. O projeto trata do Código Minerário que, segundo o deputado, só beneficia as empresas. “É o código das mineradoras. Precisamos, sim, de um marco minerário, mas é preciso que seja discutido com a sociedade”, afirmou.
O deputado federal Padre João também se posicionou contra o projeto. A sugestão do parlamentar é que seja retirado o regime de urgência, para que a proposição seja amplamente discutida.
Requerimentos - Durante a reunião, foram aprovados vários requerimentos solicitando investigação das denúncias e das condições de trabalho na empresa e providências às autoridades ambientais, policiais e judiciais para solucionar os problemas apontados.
FONTE:http://www.almg.gov.br/acompanhe/noticias/arquivos/2013/07/05_direitos_humanos_audiencia_conceicao.html