Os perdedores X
Valor Econômico
O engenheiro Paulo Ramos (nome fictício) sempre foi conservador ao investir. Mas, em 2010, resolveu comprar 1.500 ações da OGX, por R$ 20,08 cada - aplicou R$ 30 mil. Passados três anos, com o papel a R$ 0,51, ele amarga prejuízo de 97,5%, ou R$ 29,35 mil. "Fui relaxado", lamenta o engenheiro.
Há milhares de casos como o de Ramos - só na OGS há 52 mil acionistas pessoas físicas. São os perdedores do grupo X, que acreditaram em previsões de Eike Batista e de analistas. Pouco podem fazer para reduzir o prejuízo. Mas alguns tentam virar o jogo. O administrador de empresas Willian Magalhães está por trás da conta Minoritários OGX, no Twitter, com 660 seguidores, e organiza encontro para dia 13.
Avesso à exposição ao mercado acionário brasileiro, o engenheiro Paulo Ramos (nome fictício) aplicava apenas em ações na bolsa americana e em investimentos de históricos consistentes, como o conceituado fundo Verde, da Credit Suisse Hedging-Griffo. Mesmo com o perfil qualificado, há cerca de três anos ele resolveu apostar uma quantia pequena de seu capital na petroleira OGX. Segundo ele, Eike Batista, conhecido pelas declarações de impacto no mercado, mantinha o costume de conversar com empregados sobre as perspectivas para suas companhias. E chegou aos ouvidos dele que o empresário comentara com um deles, que o acompanhava no dia a dia, que as ações da OGX teriam grande chance de dobrar de preço em um ano.
O funcionário teria passado a "dica" a colegas que, por consequência, comentaram com familiares. Foi nesse contexto que Ramos se empolgou e, com pouco mais de R$ 30 mil parados em caixa, resolveu comprar 1.500 ações da empresa em 20 de setembro de 2010 pelo preço de R$ 20,08. Dezoito pregões depois, o papel atingia seu preço máximo, de R$ 23,27. "Normalmente, seria a hora em que eu venderia as ações, mas, com a forte alta em apenas uma semana, resolvi esperar um pouco mais", diz o engenheiro.
Foi então que o cenário mudou radicalmente e o papel começou a entrar num ritmo de baixa. Na sexta-feira, mesmo com uma alta de 8,5%, a ação fechou a R$ 0,51. Se realizado, o prejuízo de Ramos chegaria a 97,5%, ou R$ 29.355. "Fui relaxado. A quantia não era grande e não projetei que o papel poderia virar pó", lamenta o engenheiro, que não pretende vender os papéis no contexto atual.
A história é emblemática e ilustra como muitos investidores, muitas vezes até qualificados, acabam tomando decisões baseadas nas tais "dicas". E também mostra qual costuma ser o resultado de tal comportamento. Vale lembrar que a regra é clara: as informações sobre companhias listadas em bolsa devem, por princípio, estar disponíveis de forma igualitária para todos os investidores.
A ação da OGX, que estreou na bolsa brasileira em 2008, atingiu o preço máximo em 15 de outubro de 2010. Já no fechamento de quarta-feira passada, marcou o valor mínimo de R$ 0,39. E o que o caso do engenheiro ilustra também é como a empresa de Eike Batista seduziu de novatos a veteranos. E não foram poucos. Nada menos que 51,9 mil pessoas físicas tinham ações da OGX segundo o dado mais recente registrado na BM&FBovespa, referente a abril. É um número expressivo se comparado com o de empresas consolidadas, como Ambev, com 32,7 mil, e Pão de Açúcar, com 3,9 mil. Somados à base de OGX os dados mais recentes das outras companhias do Grupo EBX - MMX, LLX, OSX, MPX e CCX - o número de pessoas físicas passa de 80 mil.
Para vários deles, a empresa deixou perdas em diferentes momentos de sua trajetória. Quando anunciou, em janeiro deste ano, que não tinha encontrado petróleo no prospecto de Cozumel, na Bacia de Campos, a ação da OGX caiu mais de 10% em dois dias, chegando a R$ 4,10. Foi a deixa para que o engenheiro mecatrônico Gabriel Abrahão, de 24 anos, aplicasse R$ 30 mil no papel. "Minha visão na época era que uma ação que caiu 10% subiria em seguida", diz.
O engenheiro estudou balanços e relatórios da empresa e considerou que as perspectivas eram positivas. "Tinha plena consciência que era um investimento de altíssimo risco, mas, considerando o número de perfurações que a empresa estava fazendo, supus que havia a possibilidade de encontrar pelo menos um poço lucrativo", afirma. Foi assim que a OGX transformou-se no investimento arrojado do portfólio do jovem, que tem o restante do patrimônio aplicado em um terreno.
Hoje, as ações de Abrahão valem menos de R$ 4 mil. A ideia, diz, era vender os papéis assim que subissem 10%, o que não aconteceu até agora. Por ora, o engenheiro prefere segurá-los, mas não por acreditar em uma recuperação de todo o valor investido. "Meu poder de previsão está provando ser péssimo, mas talvez daqui a dois ou três anos a ação chegue a R$ 2,00 ou R$ 3,00", diz, considerando os valores oportunidades para vender os papéis. Do contrário, Abrahão diz que prefere ficar com as ações até que a empresa entre em recuperação judicial, se for este o caso.
Raphael Balsamão Saturnino, 29, é outro que amarga prejuízo de aproximadamente 75% com as ações da OGX, juntamente com amigos com quem tem um clube de investimentos. O economista, que trabalha em uma consultoria de recuperação de empresas, é também o responsável por gerir os recursos do clube. Mas as perdas, diz, são relativamente pequenas se considerado o patrimônio total.
"Entrei em março deste ano, quando a ação estava ao redor de R$ 2,00, para especular no curtíssimo prazo. Não achei que cairia abaixo disso; o BTG tinha acabado de anunciar uma parceria com o grupo", lembra, referindo-se ao acordo entre o Grupo EBX e o BTG Pactual, em que o banco oferecia aconselhamento financeiro, linhas de crédito e futuros investimentos de capital de longo prazo para projetos da empresa de Batista. "Mas fiz uma posição pequena, de cerca de 2% a 2,5%, que não afeta o patrimônio", ressalta Saturnino.
Diante da falta de perspectiva no curto prazo, há quem comece a se organizar para tentar virar o jogo. O administrador de empresas Willian Magalhães está por trás da conta Minoritários OGX, no Twitter, criada em março e atualmente com cerca de 660 seguidores. O empresário, que acompanha a história da empresa desde o IPO, prepara um encontro para o dia 13 de julho na churrascaria Fogo de Chão, em São Paulo, para reunir o grupo e juntar as posições acionárias para conseguir eleger um conselheiro e instalar o conselho fiscal. Magalhães diz que tem o apoio de um fundo de investimento, mas não revela o nome.
O empresário espera entre 100 e 200 pessoas no encontro. Magalhães diz ter participado de uma assembleia ordinária da empresa em abril, no Rio, na qual fez duas solicitações: poder se candidatar a uma vaga no conselho e a instalação de um conselho fiscal. Os pleitos, contudo, não foram atendidos por ele não ter alcançado os quóruns previstos na Lei das SA.
Depois do episódio, diz ter sido chamado para uma reunião na sede da companhia, em junho. O dono do grupo EBX não compareceu, mas Magalhães conta ter sido recebido pelo presidente e pelo diretor de relações com investidores da OGX. "Não houve, obviamente, nenhuma informação privilegiada, mas eles deixaram aberto um canal para que quaisquer novos acontecimentos fossem levados", diz.
Ainda que tenha sido alertado pela sua corretora da recomendação de venda, Magalhães começou a comprar ações da OGX em janeiro deste ano e manteve as aquisições nos meses seguintes. Hoje, o empresário tem 21 mil papéis da petroleira e calcula ter gasto perto de R$ 50 mil no investimento.
Mesmo com os preços deprimidos e com os ânimos exaltados do mercado, Magalhães mostra otimismo. "O meu investimento foi feito no longo prazo e estou tranquilo, pois, desde o princípio, estava ciente dos riscos. Com os níveis em que estão as ações, inclusive, gostaria de comprar mais, se tivesse recursos", afirma o administrador, que diz acreditar que a OGX tem condições de se "reinventar" e, em até seis anos, ter preços de ações acima de R$ 30,00.
Apesar de tudo, Magalhães continua admirando Eike como empresário e não tem queixas em relação ao comportamento da companhia nesse momento de crise. "A empresa está cada vez mais próxima e aberta às conversas com os minoritários. É importante isso, para que possamos entender o que está acontecendo."
Para Ricardo Torres, professor de finanças da BBS Business School, o caso da OGX traz à tona erros clássicos de investidores. Dentre as lições já deixadas pelo episódio, ele cita uma das regras do livro "Os axiomas de Zurique", de Max Gunther: "Quando o barco começar a afundar, não reze. Abandone-o".
O prejuízo maior para o investidor já aconteceu, diz Torres, e agora é preciso escolher entre assumir a perda ou acreditar em uma novidade. "Quem não saiu até o momento esperou demais e, já que abraçou o papel, pode aguardar por algo extremamente positivo, como uma melhoria na produção ou a compra do grupo por outra empresa", diz, ressalvando que não acredita na virada. Ainda que se reúnam, afirma, os investidores devem manter em vista o tipo de relação com a empresa. "Pelo princípio de operação de bolsa, você tem que ter responsabilidade sobre o risco que está correndo", afirma o professor.