Quando eu era aluno de graduação na UFRJ durante o regime militar, nós ficávamos fazendo um jogo meio macabro: tentar descobrir quantos policiais e informantes infiltrados existiam em cada turma. Uma coisa era evidente: havia sempre pelo menos mais um infiltrado em adição ao que todos víamos que era policial. Aliás, a gente até fazia apostas para saber quem era o informante oculto. Mas de uma coisa nunca duvidamos: sempre tínhamos um amigo policial ou agente dos serviços de inteligência sentando ao nosso lado durante aulas, conversas de corredor e passeatas. Era um fato da realidade, com qual convivíamos como algo inerente aos tempos.
Passados 28 anos desde a queda do regime militar, eis que nas massivas manifestações que ocorrem pelo Brasil afora, procuradores aparecem para tocar o terror e incitar os mais desavisados a incorrerem em atos de violência com o único objetivo de criar o caos e, por consequência, justificar o uso da repressão policial contra os segmentos majoritariamente pacíficos dos que protestam.
Mas por que devemos nos surpreender com essas tentativas de infiltração? Afinal, o aparelho repressivo saiu intacto com a queda do regime, e pode recrutar novos quadros para cumprir o papel de impedir a livre organização política no Brasil. E mais, o reconhecimento de que existem infiltrados muda o que essencialmente as causas deste levante popular contra o Estado neoliberal?
Para mim se apegar à presença de infiltrados para desqualificar o processo em marcha é permanecer alheio às suas causas e, pior, ampliar as possibilidades de que os provocadores passem a liderar esse movimento. Nesse sentido, é preciso apoiar aqueles segmentos que, mesmo rejeitando a ação de partidos, apresentem uma agenda progressiva para a luta política. A verdade é que só assim eles entenderão a importância de se organizar de forma partidária para ampliar as pressões contra as políticas neoliberais e seus efeitos no cotidiano da imensa maioria dos brasileiros.