domingo, 19 de agosto de 2012

Os Jogos Olímpicos do Rio vêm aí: foi aberta a temporada de caça aos pobres! 

Marcos A. Pedlowski, artigo publicado no número 258 da Revista Somos Assim


Agora que os Jogos Olímpicos de Londres terminaram e todas as medalhas foram entregues, talvez possamos nos livrar dos antolhos que nos são colocados pela mídia corporativa e realizar uma reflexão básica sobre a relação entre custos e benefícios de um megaevento esportivo como este. Do ponto de vista das estimativas de custo, os valores giram em torno dos R$ 20 bilhões, num esquema que foi razoavelmente conservador em termos da liberação de gastos. Esta política de conter gastos, que já era um compromisso dos britânicos ao vencer a disputa para sediar os jogos, acabou sendo reforçada pela grave crise que assola a economia mundial. 

Ainda que não existam estimativas finais sobre os retornos econômicos obtidos pelo Reino Unido, as primeiras indicações são de que o megaevento olímpico foi um rotundo fracasso econômico já que a mesma crise que impediu os desperdícios também afugentou os aficionados esportivos, o que contribuiu para cenas patéticas contendo centenas de cadeiras vazias, mesmo em esportes com grande público, como foram os casos do futebol e do vôlei. Para complicar essa débâcle econômica, as projeções fracassadas sobre o número de pessoas que iriam a Londres para assistir os jogos também implicaram numa fuga adicional dos turistas que normalmente visitam a cidade por motivos não esportivos. Em função disto, a imprensa inglesa noticiou reclamações do setor hoteleiro que se sentiu particularmente prejudicado pela presença dos jogos olímpicos. 

Mesmo sabendo que análises mais profundas ainda deverão ser feitas por pesquisadores que hoje se encarregam de avaliar os impactos econômicos e sociais trazidos para cidades onde megaeventos esportivos ocorrem, o que acaba de ocorrer em Londres já deveria estar acendendo imensas luzes vermelhas no Brasil. Afinal de contas, as estimativas financeiras iniciais para os jogos olímpicos de 2016 apontavam para um nível de gasto semelhante no Rio de Janeiro, cujo orçamento preliminar gira em torno de R$ 23 bilhões. O problema é que ao fim dos jogos londrinos, nenhuma autoridade brasileira consegue informar quanto já foi gasto no Rio de Janeiro. Aliás, o único gasto de que se tem notícia foi aquele causado pelo envio de uma caravana liderada pelo governador Sérgio Cabral que custou aos cofres estaduais a bagatela de R$ 2 milhões! 

Esse descontrole orçamentário traz à lembrança o descompasso entre o planejado e o efetivamente realizado na organização dos Jogos Pan Americanos que ocorreram no Rio de Janeiro em 2007. Para quem não se lembra mais, o orçamento inicial, de R$ 538 milhões, acabou chegando a estimados R$ 3,7 bilhões! Além disso, boa parte dos equipamentos esportivos que foram construídos ou recuperados para o Pan do Rio de Janeiro não poderá ser reaproveitada para as Olimpíadas de 2016, visto que sua condição atual não atende os exigentes critérios do Comitê Olímpico Internacional (COI). 

O mais lamentável é que existem até hoje milhares de famílias que foram desalojadas de suas comunidades que ainda esperam pela compensação financeira que, aliás, é prevista pela lei. Aliás, neste aspecto,, mesmo que não se saiba quanto foi gasto até agora ou em quanto se estima efetivamente o custo dos Jogos de 2016, já é possível verificar a aplicação do mesmo tipo de tratamento às comunidades que tiveram o extremo azar de estar no caminho das estruturas urbanas sendo implantadas em nome do evento. Um exemplo disto é a Comunidade do Autódromo em Jacarepaguá que vem sendo vítima dos tipos mais ultrajantes de pressão, e cuja erradicação sumária já foi prevista pela Prefeitura do Rio de Janeiro, a despeito do suposto compromisso do COI em prol da melhoria da vida da população das cidades onde seu megaevento ocorre. A situação da Comunidade do Autódromo é emblemática no que tange ao privilégio que é dado pelo Estado aos grandes incorporadores imobiliários e construtores que são os atores que mais vêm ganhando neste jogo. Na prática, e o Pan de 2007 já nos mostrou isto, não há nada de olímpico com os jogos olímpicos, e o que vale mesmo são os interesses econômicos dos que estão de olho no redesenho urbano que este megaevento acarreta. 

Uma pergunta que fica é a seguinte: isto valerá a pena para o esporte brasileiro? Um mérito que o quadro de medalhas possui é o de mostrar que somente sediar o megaevento não é garantia de que o país sede chegará ao topo e, repentinamente, se tornar uma potência olímpica. A verdade é que países como EUA, China, Reino Unido e Rússia já são potências pela qualidade do investimento feito no desenvolvimento de seus atletas. Olhando por este ângulo, não fica difícil antever que a realização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro terá pouco ou nenhum impacto sobre a performance brasileira. Afinal, o pouco de brilho que tivemos em Londres, vide o caso emocionante dos irmãos boxeadores Esquiva e Yamaguchi Falcão, fica por conta de incríveis histórias de superação pessoal e familiar, e tem pouco a ver com um investimento sério e qualificado na evolução do esporte brasileiro. 

Mas, como esperar algo diferente numa sociedade que prefere posar de moderna enquanto continua afundada numa mentalidade oligárquica e fascitóide?