Por Paulo Passarinho
Nessa semana, a Alerj – Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro – aprovou um projeto que proíbe o uso de máscaras em manifestações políticas. Os nobres parlamentares – e, em geral, em sua esmagadora maioria, péssimos cidadãos e vassalos de Sergio Cabral Filho – imaginam que com essa proibição estarão dando alguma contribuição para o combate ao que chamam de “vandalismo” nas manifestações.
A medida já foi considerada por muitos – inclusive pela OAB-RJ – como inteiramente inconstitucional, mas, em se tratando do Brasil atual, esse parece não ser o problema. A Alerj poderia e deveria tratar de assuntos mais sérios. Razões não faltam. Temos, por exemplo, cotidianamente, problemas que continuam a se manifestar na área dos transportes urbanos. Os usuários da Supervia, das Barcas, do Metrô se defrontam diariamente com abusos dos concessionários de toda ordem: desconforto, atrasos, acidentes, longas filas e tarifas com preços exorbitantes.
Os professores da rede estadual se encontram em greve; a rede de saúde pública do estado agoniza; a privatização do Maracanã, após uma dita reforma que consumiu mais de um bilhão e duzentos milhões de reais, está entregue a um consórcio liderado pela Odebrecht, que impõe, por sua vez, preços elevadíssimos, péssimo atendimento ao público – do processo de venda dos ingressos às condições de acesso ao estádio -, além de lesivos contratos de parceria com os clubes cariocas.
Um dos sócios do consórcio que administra o Maracanã é, curiosamente, uma empresa pertencente ao empresário Eike Batista. Vendo os seus negócios irem à falência, deixa toda a área do Porto de Açu - no norte do estado, onde o especulador anunciava projetos mirabolantes e teve toda a sorte de facilidades fiscais, financiamentos públicos e até mesmo a ação da PMRJ a seu serviço –- entregue a sua própria sorte. Especialmente a sua população, desalojada de suas terras originais.
Esses são apenas alguns exemplos do descalabro político e institucional que vivemos no estado. Contudo, no plano federal, a semana igualmente nos reservou novidades. A principal delas foi, mais uma vez, a denúncia da espionagem promovida pela Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos, no Brasil. Desta feita, a própria Petrobrás está no olho do furacão. Sua rede de informações corporativa foi bisbilhotada pelos americanos e deixou claro, para a própria presidente Dilma, que os interesses eram de natureza econômica e empresarial, passando ao largo de qualquer explicação ou justificativa envolvendo razões de segurança contra o chamado terrorismo internacional.
Esta semana também nos reservava a apresentação dos esclarecimentos do governo Obama para o incidente diplomático da espionagem de e-mails, conversas telefônicas e contatos entre autoridades brasileiras, incluindo a própria Dilma Rousseff, revelado na semana anterior. O dia da resposta dos gringos era a quarta-feira e para os Estados Unidos foi despachado o próprio ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, com o objetivo de receber pessoalmente essas supostas explicações. A razão dessa viagem é por si só um descalabro: se alguém deveria se deslocar do seu país de origem, seria evidentemente a autoridade do país acusado de violar normas elementares do direito internacional. Mas, muito mais patética do que essa conduta de subserviência do governo brasileiro foi a própria resposta em si dos americanos.
Resposta evasiva, eles admitem que as revelações da imprensa criaram tensões “na forte relação bilateral que temos com o Brasil”. Entretanto, afirmam que essas revelações “distorcem nossas atividades e algumas das quais levantaram questões legítimas de nossos amigos e aliados sobre como essas potencialidades são empregadas”. O que foi, portanto, um claro ataque à nossa soberania, para os americanos tudo não passaria de “potencialidades”, e da forma como são utilizadas.
Pelo lado brasileiro, que de acordo com o nosso governo estaria esperando essa resposta para definir o que fazer, inclusive com relação à próxima visita de Estado de Dilma Rousseff aos Estados Unidos, em outubro próximo, o que houve até o momento foi apenas um ensurdecedor silêncio do nosso chanceler, talvez obedecendo àquela máxima brasileira de que “manda quem pode, obedece quem tem juízo”.
A melhor prova disso é que, já no dia seguinte às novas revelações da espionagem contra a Petrobrás, rapidamente o ministro das Minas e Energia, bem como a diretora-geral da ANP deixavam claro que o leilão do Campo de Libra estaria mantido, sem qualquer risco de sua suspensão. Aliás, no mesmo dia em que a revista Forbes publicava um artigo que serviria como defesa à espionagem da Agência Nacional de Segurança à Petrobras. A reportagem, escrita por Christopher Helman, mostrava-se a favor da agência, destacando "que seria muito mais chocante se a NSA não estivesse reunindo toda a informação que pudesse do Brasil e da Petrobras". Segundo ele, a estatal brasileira é inchada e dominada por corrupção. Segundo o artigo, a empresa tem enfrentado muitos problemas e leva a incertezas quanto ao investimento na área de petróleo no País. "Uma Petrobras mais fraca é um Brasil mais fraco, o que significa uma América do Sul menos estável. Isso não deveria ser do interesse da NSA?". De acordo com a matéria, como a empresa é parte da administração da presidente Dilma Rousseff e tem controle estatal, a espionagem da empresa não é diferente de qualquer outra do governo brasileiro. Dentre os motivos apresentados para a espionagem, está o fato de a presidente ter sido responsável por estruturar a empresa desde 2003, quando esteve no Ministério de Minas e Energia, e continuou exercendo esta função na Casa Civil. Além disso, Dilma foi a responsável por indicar a atual presidente da petrolífera, Graça Foster, em um momento em que a empresa arcou maiores prejuízos, por conta da política do governo. Como "fatos legítimos" para a espionagem, estariam ainda as denúncias de corrupção e a preocupação das empresas de petróleo no exterior, com a exploração na camada do pré-sal.
De fato, as máscaras caem. E não são aquelas dos manifestantes, conforme os desejos dos parlamentares da Alerj. É apenas a desfaçatez dos dominadores que mais uma vez mostram, sem pudores, a sua cara.
Paulo Passarinho é economista e apresentador do programa de rádio Faixa Livre.