Pedro Carrano, de Curitiba (PR)
É a primeira vez em dez anos que a Vale não vai distribuir dividendos extras a seus acionistas. Ao contrário de 2011, neste ano a mineradora se limitou ao pagamento da segunda parcela de 3 bilhões de dólares de um total de dividendos mínimos de 6 bilhões de dólares que haviam sido aprovados pela diretoria executiva da companhia para o ano de 2012.
Entretanto, em 2011, o retorno aos investidores totalizou 9 bilhões de dólares, valor 33% acima do total mínimo destinado a eles em 2010. Fato é que o ano passado foi considerado de lucratividade alta, sobretudo devido a um ciclo de boas vendas do minério de ferro, ciclo este que também remete ao ano de 2006, quando foi comprada a mineradora canadense Inco, produtora de níquel, e a corporação passou a deslanchar como empresa de expansão internacional.
O Canadá, em 2012, foi o alvo de 11,7% do investimento da maior mineradora a céu aberto do mundo, o que mostra a dimensão das operações hoje naquele país. Perdeu apenas para os investimentos no Brasil, que alcançam a casa de 63,7% dos investimentos da Vale. O ano de 2011 foi ainda de retorno recorde de capital da empresa, por volta de 12 bilhões de dólares, de acordo com o Relatório Anual da Vale do mesmo ano. O lucro operacional da mineradora alcançou a casa de 30 bilhões de dólares em 2011, segundo o mesmo documento.
Declínio?
Um comparativo entre os anos de 2007 e 2011 aponta que o montante de produtos vendidos pela empresa é menor atualmente. A Vale passa por um quadro de endividamento, que se traduz em R$ 4 bilhões de dívida com o Estado brasileiro e mais R$ 30 bilhões em dívidas com a Receita Federal (são dívidas de Imposto de Renda, por exemplo) que não se justificam. Isso porque, dentre outros motivos, o pagamento de royalties de mineração no Brasil é irrisório quando comparado com outros países. Aqui, está na casa de 2%, ao passo que, no Canadá, chega a 10% de taxação na região de Ontário e 17% em Manitoba. Na Austrália, este preço alcança 8,2% de taxação para minas a céu aberto. A lucratividade da mineradora é gigantesca.
Segundo organizações e especialistas, a queda nos resultados da empresa se relaciona com a demanda oriental. “A principal razão da queda das ações da Vale é a instabilidade no mercado do minério, a perspectiva de uma diminuição de consumo de ferro por parte da China e a dependência excessiva, nessa conjuntura, da Vale com a China”, analisa Danilo Chammas, da organização Justiça nos Trilhos, que integra o Movimento dos Atingidos pela Vale.
Na mais recente assembleia anual ordinária de acionistas da empresa, no Rio de Janeiro, em abril de 2012, a presença de acionistas críticos foi consistente e bastante abordada pela imprensa. À época, também foi entregue um certificado a cada um dos acionistas e representantes da Diretoria e do Conselho de Administração ali presentes para que a Vale recebesse o prêmio de ‘Pior empresa do mundo’ (Public Eye Award 2012), anunciado durante o Fórum Econômico Mundial de Davos, em janeiro deste ano.
Neste contexto, a Vale continua propondo projetos agressivos de expansão. O principal deles se dá na região Norte do Brasil. Na avaliação de Chammas, há uma postura da empresa no sentido de aprovar projetos passando por cima da legislação ambiental. “O risco de ter suas obras paralisadas pelo Poder Judiciário é algo que deve estar preocupando muito a direção da empresa, que deve se esforçar para tranquilizar os acionistas.
A empresa tem investido muitas forças no enfrentamento jurídico e também com uma nova política, inaugurada há cerca de um ano, de incidência sobre os órgãos de licenciamento para conseguir “um processo de licenciamento ambiental muito mais ‘azeitado’”, descreve Danilo Chammas, referindo-se à conference call (audioconferência) cedida por Luciano Siani, Diretor Executivo de Finanças e Relações com Investidores, onde teria feito esta referência.
A intencionalidade da Vale na exploração de minério-de-ferro resultou que a maior reserva de minério do planeta, em Eldorado dos Carajás (PA), foi reduzida de 400 para 85 anos de estimativa de exploração, no curto espaço de uma década, sinal do extrativismo intenso na região. De todo o minério exportado em 2010, 70% teve Carajás como origem e a China como destino, como já apontavam informações do Fórum Social Mundial do ano de 2009.
A intenção agora é montar uma infraestrutura cujo destino é o porto de São Luís, no Maranhão. “A Vale está precisando mostrar aos acionistas a força e as perspectivas de novos grandes investimentos de médio prazo”, descreve. O maior é a duplicação do Sistema Norte: abertura de uma nova enorme mina (S11D, com potencial de 90 milhões de toneladas ao ano); construção de uma segunda ferrovia de 900 Km ao lado da primeira; um novo ramal ferroviário de 100km e a ampliação do porto de Ponta da Madeira, em São Luís (que já é o porto mais profundo da América Latina), para exportação.