sexta-feira, 3 de junho de 2011

Oxfam acusa a Europa de agravar a fome mundial




ONG britânica lança campanha internacional e sustenta: subsídios da Europa e EUA, e insistência em biocombustíveis ineficientes, elevam preços e emperram combate à fome

Por Timothy Spence, da Inter Press Service News Agency (IPS)



Bruxelas, Bélgica, 1/6/2011 – Diante do aumento dos preços dos alimentos, que ameaça deixar mais milhões de famintos a cada ano, a Europa deve abandonar os subsídios e desacelerar os esforços na produção de biocombustíveis, afirmou a organização Oxfam. Ao apresentar sua nova campanha mundial contra a fome, o grupo também exortou a União Europeia (UE) a acompanhar mais de perto o comércio de matéria-prima e apoiar agricultores de pequena escala no Sul em desenvolvimento.

Phil Bloomer, diretor de campanhas da Oxfam na Grã-Bretanha, disse que promover a produção de combustíveis à custa da produção de comida é um “escândalo obsceno” que contribui para o aumento do preço do milho e de outros produtos básicos. O custo dos alimentos cresceu firmemente nos últimos meses, depois de atingir, em 2008, seu pico em 30 anos. “Exortamos a UE a acabar com seu mandato sobre os biocombustíveis e reorientar sua ajuda ao desenvolvimento com um nível maior de concentração, e também pedimos que realmente lidere o mundo nos esforços para encarar a volatilidade dos preços, a transparência e a regulação do mercado de alimentos”, disse Bloomer à IPS no lançamento da campanha “Grow” (Crescer), da Oxfam.

Os líderes europeus já são pressionados a repensar as políticas sobre alimentos e combustíveis. A Comissão Europeia, órgão executivo da UE, realiza uma revisão dos efeitos da produção de biocombustíveis, e o Parlamento Europeu examinará no próximo verão boreal as regras para fortalecer o acompanhamento do comércio de produtos básicos e derivados. Os fundos-índices de matéria-prima cresceram em valor, passando de 11 bilhões de euros em 2003 para 204 bilhões em 2008, segundo a Oxfam.

Em um informe que acompanha a nova campanha sobre segurança alimentar, a organização exorta a UE a rever sua Diretriz de Energia Renovável de 2009, segundo a qual 10% dos combustíveis devem derivar de plantas até 2020, duplicando o consumo atual. A política também estabelece que 20% devem ser dedicados a energias renováveis e, até meados do século, deve-se reduzir as emissões de gases-estufa em 80% com relação aos níveis de 1990.

O informe da Oxfam, intitulado “Cultivando um Futuro Melhor”, diz que os “imperfeitos” incentivos da UE aos biocombustíveis incentivam a alta dos preços dos alimentos, ao desviar os esforços de produção. Além disso, os incentivos levam as companhias a buscar terras e mão de obra barata em países do Sul para exportar para a Europa, acrescentando competição na agricultura das nações que mais necessitam de alimentos, diz o estudo.

As recomendações se dirigem à UE, mas a Oxfam também exorta os Estados Unidos (onde cerca de 40% das colheitas de milho são destinadas à produção de combustível ou seus aditivos) a acabar com os subsídios. A organização alerta que, se não houver mudança nas políticas, o preço do milho e de outros produtos básicos pode mais do que duplicar em 20 anos, enquanto a produção diminui.

Desde 2008, quando os preços dos alimentos alcançaram seu pico em 30 anos, 100 milhões de pessoas foram arrastados para a pobreza, em parte devido ao alto custo dos alimentos. Somente na África oriental, oito milhões de pessoas sofrem escassez de comida hoje, e os números podem duplicar em dez anos. Em todo o mundo, 925 milhões de pessoas passam fome.

Os subsídios anuais para os biocombustíveis somaram US$ 20 bilhões em 2010 (sendo US$ 4,3 bilhões da Europa e US$ 7,3 bilhões dos Estados Unidos), segundo a Iniciativa Global de Subsídios. Em contraste, a ajuda total ao desenvolvimento agrícola totalizou US$ 9,8 bilhões no mesmo ano.

Além de traçar metas de subsídios e produção de biocombustível, a Oxfam também exorta a UE a impulsionar a ajuda agrícola a pequenos proprietários de terras no Sul em desenvolvimento e expandir um programa criado em 2008 para a crise de alimentos. A Facilidade Alimentar da UE forneceu US$ 1 bilhão durante três anos e expandiu a capacidade financeira, de infraestrutura e armazenamento de pequenas zonas agrícolas nos países mais necessitados. a África é uma prioridade, especialmente à luz do aumento dos preços. O Fundo das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) informou, em maio, que os preços do milho e do trigo continuaram crescendo, embora de outros, como o arroz, tenham se estabilizado pela primeira vez em meses. Os preços do milho e do trigo aumentaram 30% este ano em algumas regiões da África.