Uma reflexão sobre a UENF que estamos construindo e devemos manter: não à precarização da DE que ameaça destruir o nosso vitorioso modelo institucional!
A Universidade Estadual do
Norte Fluminense (UENF) foi criada dentro de uma atmosfera de inovação em sua
concepção original e desde a sua fundação. Este modelo institucional, hoje em
risco devido a posturas que efetivamente ignoram os impactos dessa
originalidade na vitoriosa evolução que tivemos em menos de 20 anos, nasceu com
100% do seu corpo docente com doutorado e dedicação exclusiva e um corpo
técnico também altamente qualificado com formação e especialização (ex.:
Mestrado, Doutorado ou experiência acadêmica compatível). No plano acadêmico
tínhamos um ciclo básico comum (CBC) que depois de poucos anos de
funcionamento, em meio à resistência interna por parte de núcleos
conservadores, acabou sendo extinto. No entanto, recentemente com a criação de
algumas instituições federais (ex.: Universidade Federal do ABC e Universidade
Federal dos Vales dos Rios Jequitinhonha e Mucuri) este modelo foi reproduzido
e, pasmem, considerado inédito. Primeiro
elemento para reflexão.
Vivendo intensamente estes
20 anos dentro da UENF, pois estou nesta instituição desde a sua criação, ou
melhor, antes mesmo do seu início formal em 1993, pois trabalho neste projeto
desde 1992, ainda no Rio de Janeiro na antiga FAEP, pude presenciar diferentes
momentos onde se procurou os caminhos mais fáceis. Mas nos momentos anteriores,
a razão venceu e a instituição começou a apresentar indicadores de desempenho
que podem ser considerados acima da média para uma jovem instituição. Como
chegamos a este nível? Certamente, devido à dedicação de um grande número de
docentes e técnicos, e também devido ao nível de qualificação destes
profissionais. Já tivemos no quadro da instituição cerca de 10 membros
titulares da Academia Brasileira de Ciências que, em muito, contribuíram para o
desenvolvimento da UENF. Esta instituição, desde o seu início, teve como
norteador o ensino e a pesquisa em nível elevado, e considerando a extensão
como um elemento adicional para transformação junto a nossa atividade fim.
Assim, considero que o direcionamento conceitual da UENF deva continuar sendo
dado por aqueles que apresentam um mínimo de expressão acadêmica. Ainda
reconheço que existem casos que despertam atenção, pois não têm um regime de
publicação e orientação compatível com o que se esperaria de um docente com
dedicação exclusiva, mas este seria um elemento de trabalho institucional, e
não um motivo para se acabar com a Dedicação Exclusiva. Em síntese, e parafraseando
o ilustre Prof. Carlos Chagas Filho, eu diria que nossa instituição ensina e
tem obtido bons indicadores é porque fazemos pesquisa de alto nível, e isto só
foi possível por estarmos desde nossa fundação sob um regime de Dedicação
Exclusiva. Segundo elemento para reflexão.
A situação salarial na qual
nos encontramos, não é uma novidade na UENF, pois com a falta de uma política
de reajuste anual, sempre nos deparamos com situações como a atual. Para usar o
termo do momento, a distorção salarial na UENF atinge todos os segmentos e não
há necessidade de fazer muito esforço para esta constatação. No entanto, no que
tange ao corpo docente os constantes editais de concurso público para as
Universidades Estaduais e Federais expõem o nível de defasagem salarial dentro
no núcleo de servidores docentes. No entanto, gostaria de informar para os que
não viveram o conjunto da história da UENF, que esta não é a primeira vez que
nos defrontamos com uma situação como esta, ou seja, um grupo a favor da quebra
da DE e outro não. Os argumentos foram e são os mais variados, mas incluem: 1)
não existem doutores suficientes em todas as áreas do conhecimento e precisamos
de profissionais que não sejam doutores atuando como docentes; 2) não
precisamos de doutores em todas as áreas e vejam as outras instituições elas
não possuem 100% do seu quadro docente com DE; 3) não conseguiremos atrair
doutores com este nível salarial.
No entanto, apesar da
existência continuada desses argumentos, a UENF sempre resistiu aos diferentes
ataques ao seu modelo institucional. No passado houve uma proposta de curso
onde os profissionais não possuíam qualificação, mas se ventilou a
possibilidade de atribuir o título de “Notório Saber” a um conjunto de
profissionais que sequer possuíam o título de graduação na área em que estão. Esta tentativa não deu certo, pois a UENF se
manteve soberana e fiel ao seu modelo institucional. Agora, sob a capa do
pagamento de um direito relativo justamente ao nosso regime de trabalho, novamente
nos defrontamos com uma proposta que fere mortalmente um modelo institucional
que vem sendo perseguido por outras instituições. Além disso, prezados colegas,
não faz o menor sentido termos que aceitar uma proposta para remuneração da
Dedicação Exclusiva que, ao mesmo tempo, efetivamente a destrói. A argumentação
feita pelos técnicos da SEPLAG de que não existe uma universidade com 100% de
docentes com DE não é aceitável, pois a UENF veio como uma proposta de modelo
institucional inovadora e como tal, precisa ser defendida e devidamente
entendida por todos nós. Além disso, essa visão ignora a tendência inexorável
de que todas as universidades públicas brasileiras venham a ser em médio prazo
formadas por corpos docentes constituídos apenas por doutores trabalhando sob o
regime de Dedicação Exclusiva. Portanto, quando dentro do quadro docente, se
abre mão de um modelo institucional por uma questão financeira de natureza imediatista,
estamos comprometendo o futuro da UENF. Terceiro
elemento para reflexão.
Em última análise, sei que
não é fácil resistir à tentação de se obter ganhos financeiros imediatos, mas
esta proposta é tão frágil quanto aos que a defendem como a última
possibilidade para recebermos algum tipo de benefício financeiro. No passado
tivemos lutas tão importantes quanto a atual, onde mantivemos intacto o modelo
institucional e o nosso regime de trabalho. Para os que não conhecem, houve um
tempo onde a proposta era criar uma bolsa para os docentes, para nos dar a
mesma benesse representada pelo Pró-ciência. Entretanto, nós resistimos e
conseguimos uma reposição salarial. Em outro momento, se dizia que a única
saída para manter um grupo de docentes era a cooperativação destes
profissionais numa cooperativa mantida dentro de uma instituição local. Mais
uma vez, nós resistimos e conseguimos mantê-los dentro da UENF até que fossem
realizados os concursos. Também houve um tempo, onde o ponto dos que estavam em
greve, para defender a autonomia administrativa da UENF em relação à FENORTE foram
cortados. E novamente, nós resistimos e conseguimos a aprovação da lei que deu
à UENF a autonomia de que desfrutamos nos dias de hoje. E mais recentemente,
quando se dizia que não conseguiríamos os 22% concedidos aos técnicos
administrativos com posturas supostamente radicais, nós resistimos, mantivemos
nossa coerência e conseguimos esta reposição salarial.
Agora chegou a hora de
resistirmos à uma tentativa que manifestadamente visa destruir o nosso
vitorioso modelo institucional. A nossa unidade e disposição para defender os
nossos direitos nos dará a condição de garantir a devida remuneração da DE sem
que tenhamos de abrir mão do nosso modelo institucional. Quarto e Último elemento para reflexão.
Concluindo, ressalto que
poderia incluir outros elementos, mas para não ampliar demasiadamente minhas
reflexões, procurei manter um direcionamento em alguns pontos que considero
relevante para iniciarmos nossas ponderações sobre o presente e futuro da nossa
instituição e do nosso corpo docente exposto as constantes situações de
constrangimento funcional.
Carlos
Eduardo de Rezende (Carlão) – Um dos primeiros membros do corpo docente da UENF, atualmente é Professor Titular e Chefe do Laboratório de Ciências Ambientais; Bolsista de Produtividade do CNPq desde 1993 e Cientista do Nosso Estado. Participou de outras instâncias administrativas na UENF. Um dos fundadores da ADUENF, além de ter participado de 2 gestões desta Associação.