Por Carlos Tautz
Na semana passada, após três descarrilamentos em apenas sete dias, os jornais descobriram que os trens do Rio são um serviço que não possui a mínima qualidade para transportar mais de 600 mil passageiros diários, e que o governo do Estado fecha criminosamente os olhos a isso desde privatização da concessionária SuperVia em 1998.
Trens, barcas, metrô, empresas elétricas, banco. Quase todos os serviços públicos estaduais foram privatizados ao redor daquele ano, quando o então governador, Marcello Allencar, do PSDB, queimava patrimônio público baseado na ideologia de ódio contra qualquer coisa que fosse estatal.
Na Presidência da Assembleia Legislativa do Rio, um jovem político tucano participava do esquema para alienar Flumitrens, CBTU, Banerj, Conerj, Light e Cerj (a Cedae escapou, mas opera numa lógica privada, associada a empreiteiras como a Delta, que deitam e rolam nos contratos públicos).
Foto: Erbs Jr.
Mais tarde, o tucano aderiria ao PMDB, viraria governador e proveria a ex-Flumitrens, hoje SuperVia, com bilhões do Tesouro estadual. Ele é Sérgio Cabral, o mesmo dos guardanapos com Cavendish, dos passeios nos jatinhos de Eike e cujo nome não pode ser dissociado da crise diária que se abate sobre os trens fluminenses, desde o início do mais recente ciclo de crise no serviço e que se inicia na privatização. Crise, teu nome é Cabral.
Além de se omitir diante das barbaridades da SuperVia, ele foi muito além. Em 2010, renovou a concessão à empresa, 13 anos antes de a concessão original vencer, no mesmo dia em que a Supervia foi multada em R$ 150 mil pelas chibatadas aplicadas por seus seguranças a passageiros na estação de Madureira, em 2008.
A agência reguladora estadual autorizou Cabral a renovar a concessão por mais 25 anos, até 2048, e concluiu uma negociação de dois anos.
Provavelmente Cabral já sabia que a SuperVia seria vendida à Odebrecht meses mais tarde. A empreiteira adquiriu 60% da concessionária de trens e, apesar possuir expertise em obras civis e crédito na praça para investir na empresa e rapidamente melhorar as condições de operação, na prática nada mudou para o usuário.
Nas poucas vezes que vem a público desde que se soube dos guardanapos, Cabral ainda se comporta como mandatário da empresa – ou seja, defendendo a situação indispensável dos trens – e reforça a impressão de um vínculo pouco claro com uma concessionária que se caracteriza pelas irregularidades.
Em sua defesa, se é que isso serve de alguma coisa, reconheça-se que nenhum outro governante desde a privatização fez diferente: Garotinho, Benedita e Rosinha andaram em trilhos semelhantes e nem arranharam a concessão quase eterna da SuperVia.
Carlos Tautz, jornalista, é coordenador do Instituto Mais Democracia – Transparência e controle cidadão de governos e empresas.