Obras do Porto salinizam águas e terra da Baixada - PMSJB distribui água salgada imprópria para consumo humano
Apesar das fantásticas apresentações a investidores, promessas mirabolantes, incentivos governamentais e fabulosos recursos oficiais captados, as obras de construção do Superporto do Açu não mostram transparência suficiente em relação aos graves problemas sociais causados e aos enormes danos ambientais envolvidos.
Diante da estranha indolência e da arraigada incompetência do Inea na região, surgem provas irrefutáveis de grandes prejuízos ambientais causados pela implantação das empresas da EBX no Açu sem que nenhuma providência efetiva esteja sendo tomada.
Construção dos canais do estaleiro é a maior responsável pela salinização
As obras do estaleiro da OSX – que segundo anuncia o site da OSX, “obteve priorização pelo Conselho Diretor do Fundo da Marinha Mercante (FMM) de uma linha de crédito que pode chegar a até R$ 2,7 bilhões e prazo de 10 anos para a construção da Unidade de Construção Naval do Açu (UCN Açu), e, em janeiro de 2012, já recebeu desembolso no valor de USD 427,8 milhões, correspondente a um empréstimo-ponte contratado com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para essa finalidade” – são apontadas pelos pesquisadores da Uenf como as maiores responsáveis pelo que está se desenhando como um dos maiores desastres ambientais da região, já que o canal tem 13 quilômetros de extensão por 300 de largura e 18 de profundidade, gerando um volume de dragagem de faraônicos 43 milhões de m³.
A gigantesca retirada de areia com água salgada, inicialmente pela draga Cyrus II (uma das maiores do mundo), da empresa holandesa Boskalis, e, posteriormente, pela draga holandesa Sea Way, realizando o aprofundamento do canal dos atuais 8 metros para 14,5 metros de profundidade, com capacidade de sucção de mais de 30 mil m³ por hora, para construção dos canais do estaleiro, com milhares de toneladas de areia e água do mar despejadas através de um duto, sem nenhum tipo de contenção, em um aterro hidráulico às margens do empreendimento, e com canais de drenagem desviando uma incrível quantidade de água salgada para as terras férteis vizinhas, está salinizando todo o lençol freático do Açu e os canais que irrigam parte da Baixada.
Mas a dimensão do dano ambiental é incalculável, pois, além da salinização das redondezas, o desastre ambiental está chegando às terras férteis da Baixada através da salinização de toda a bacia hidrográfica local, conduzida pelos tradicionais canais de irrigação.
Guerra química?
Entre os moradores do 5º Distrito paira uma interrogação: salinizar a água e as terras da região não seria uma forma de guerra química utilizada para vencer a resistência dos que insistem em resistir às questionáveis desapropriações?
A dúvida tem fortes fundamentos, pois sem água para beber para humanos e animais, sem água para irrigar, e terras para plantar lavouras, será impraticável sobreviver no local. Coincidência ou não, com a salinização das águas e das terras as empresas X estariam matando dois coelhos com uma só cajadada, construindo os canais e expulsando os pequenos proprietários locais.
Água distribuída pela PMSJB está salinizada
Em entrevista exclusiva à equipe de reportagem da Somos, o Prof. Dr. Carlos Eduardo Rezende, do Laboratório de Ciências Ambientais (LCA) da Uenf, relatou o resultado de uma pesquisa realizada no 5º Distrito de São João da Barra com a água que a população está consumindo, distribuída sem monitoramento pela Prefeitura Municipal de São João da Barra, que, segundo os resultados obtidos por testes de condutividade elétrica com equipamentos de última geração, revelou um nível de sal muito além do normal, colocando em grave risco a saúde da população local, além de prejudicar animais domésticos, a fauna e a agricultura, já que o processo de salinização da terra é acelerado e irreversível.
Mas o problema ainda é muito mais grave do que se poderia imaginar. Além de a água distribuída pela PMSJB à população estar salinizada em cerca de sete vezes acima dos níveis admissíveis para consumo humano, a água dos poços para irrigação também apresenta níveis várias vezes superiores aos indicados para irrigação das lavouras e para o trato dos animais. Para piorar ainda mais a situação, o Canal do Quitingute, que irriga grande parte da Baixada, está apresentando níveis astronômicos de sal, chegando a 17 mil de condutividade, quando o recomendado pela Embrapa é de condutividade elétrica menor que 300 uS/cm, acima disso representa potenciais riscos à salinização do solo. A água de drenagem (ponto 3 da pesquisa) da área do aterro hidráulico, localizada acerca de 5 km do local, apresenta salinidades que chegam a 10,8 psu, ou seja, 31% do valor de salinidade da água do mar. Esta água é drenada (pontos 5 a 7) para o canal Quitingute, utilizado para a irrigação de áreas agricultáveis da baixada campista.
Em 2011, o canal do Quitingute foi caracterizado como de águas doces e com baixa condutividade elétrica pelo EIA/RIMA: Infraestruturas do Distrito Industrial de São João da Barra, em maio de 2011. Como se pode ver pelo próprio EIA/RIMA, o processo de salinização do Quitingute é assustador, pois, atualmente, está com um terço da salinidade do mar.
População denunciou
A população do 5º Distrito de São João da Barra acionou o Laboratório de Ciência Ambientais da Uenf, alegando que estava aparecendo água onde não havia antes (elevação do lençol freático) e que as plantas que estavam em torno dessa água estavam morrendo.
Pesquisadores da Uenf vão a campo. Resultado mostra perigo de desertificação
Diante da preocupante situação, uma equipe de pesquisadores do Laboratório de Ciência Ambientais da Uenf, composta pelo Dr. Carlos Rezende (Doutor em Ciências Biológicas, especializado em Oceanografia Química e Mestre em Geociências), a Drª Marina Suzuki (Doutora em Ciências Biológicas, Mestre em Ecologia e Recursos Naturais e em Biociências e Biotecnologia), Mestre Tiago Rangel (Biólogo no LCA da Uenf e Mestre em Geoquímica Ambiental) e a Mestre Carolina de Cássia Ribeiro de Abreu (Mestre em Políticas Sociais), deu início a uma detalhada pesquisa científica para apurar o que estava acontecendo nas terras (e nas águas) do 5º Distrito. Durante algumas semanas foi realizado um minucioso trabalho de campo com coleta e exame de amostras de água de diversos pontos da região, todos cuidadosamente registrados por GPS, com os exames realizados in loco com equipamentos sofisticados.
Segundo os resultados da pesquisa, a água está imprópria para consumo humano, de animais ou agrícola. Além da grande dimensão da agressão ambiental, é surpreendente o seu potencial geométrico de salinização de terras na vasta área de abrangência da bacia hidrográfica da Baixada, podendo acarretar a desertificação de enormes áreas de terras férteis.