A Rio +20 vai acontecer em contexto sombrio para o meio ambiente e para os pobres
Marcos A. Pedlowski, artigo publicado no número 233 da Revista Somos Assim
Em Junho de 2012 o Brasil estará novamente sediando uma conferência mundial organizada pela Organização das Nações Unidas para discutir a situação ambiental do nosso planeta. Esta conferência foi batizada de Rio +20, pois neste ano completamos duas décadas da ECO-92, conferência que trouxe centenas de chefes de Estado à cidade do Rio de Janeiro para tentar estabelecer uma nova ordem jurídica que regulasse as relações entre o mercado, a sociedade e o ambiente. Ainda que em 1992 os documentos finais tenham ficado muito aquém do que os mais otimistas esperavam, a maioria dos analistas viu o resultado final como alentador, pois foi estabelecida uma série de acordos importantes que apontavam no sentido de uma relação mais equilibrada entre as demandas da economia de mercado, a população e os ecossistemas naturais.
O otimismo inicial se dissipou dado que, em muitos casos, o que houve foi regressão e não avanço na busca daquilo que se convencionou chamar de “desenvolvimento sustentável”. Um dos maiores fiascos gestados durante a Rio 92 foi o Protocolo de Kyoto. A conferência realizada em Kyoto em 1997 decorreu da decisão de 160 líderes presentes no Rio de Janeiro em assinar a chamada Convenção Marco sobre Mudança Climática, a qual estabeleceu uma série de passos para a diminuição da emissão de gases poluentes. Infelizmente, não apenas as metas estabelecidas no Protocolo não foram assinadas, como outras conferências realizadas para alcançar novos acordos sobre o problema dos gases de efeito estufa não chegaram a bom termo, o que na prática significou num abandono das metas estabelecidas em Kyoto.
Por outro lado, o Protocolo de Kyoto não é o único fracasso em relação ao que foi estabelecido na ECO-92. Na verdade, nas últimas duas décadas não houve nenhum caso onde os acordos internacionais ligados à proteção do ambiente lograssem implementar as suas metas. Como resultado, o mundo vive hoje um processo de aprofundamento de práticas que não passam nos testes de sustentabilidade. Pelo contrário, é provável que se todas as metas estabelecidas fossem comparadas com o que acabou ocorrendo, o que teríamos de informar é de que a situação piorou. As razões para este retrocesso são muitas, mas a maioria está ligada aos ciclos de crise pelo qual a economia mundial vem passando. É que diante de cenários de crise, as corporações tem se sentido menos tentadas a inovar suas práticas, não investindo em tecnologias que diminuam o desperdício e a produção de rejeitos poluentes.
No caso do Brasil, a retomada de uma visão de desenvolvimento ancorada em idéias ultrapassadas significou um grande enfraquecimento no pouco controle que existia na autorização de obras de grande impacto social e ambiental. O mais peculiar é que foi justamente nos dois mandatos de Luís Inácio Lula da Silva que se operou uma regressão quase completa nos mecanismos de licenciamento ambiental, com a retomada do paradigma estabelecido pelos ideólogos do regime militar de 1964 de que a Amazônia seria um celeiro energético. Como resultado disto, rios importantes como o Madeira e o Tapajós estão sendo represados para a construção de grandes hidrelétricas cujo propósito é basicamente alimentar plantas industriais que realizarão um beneficiamento primário de vários minérios cuja demanda internacional está em alta, como é o caso da bauxita.
No caso do Rio Janeiro, estado que sediará a Rio +20, os estragos sendo perpetrados em nome de um desenvolvimento à “La década de 50 do Século XX” foram agravados pela implementação de um modelo de licenciamento ambiental pulverizado que eu alcunhei de “licenciamento Fast Food”. O sucesso do licenciamento “Fast Food” foi tão grande que o seu mentor, o lépido secretário estadual de Meio Ambiente, Carlos Minc, foi enviado a Brasília para ocupar a cadeira de ministro do Meio Ambiente. Entretanto, não é preciso ir longe para ver os impactos que já estão ocorrendo como resultado da pulverização dos processos de licenciamento ambiental de mega-empreendimentos em várias áreas ecologicamente sensíveis no litoral fluminense.
O caso mais emblemático é o da Baía de Sepetiba, para onde foram levadas diversas plantas de alta capacidade poluidora, como foi o caso da Companhia Siderúrgica do Atlântico do grupo alemão Thyssen-Krupp. A área que antes era um importante berçário para centenas de espécies da fauna marinha, e de onde centenas de pescadores obtinham seu sustento, hoje se assemelha mais a um deserto morto pela poluição. No entanto, os problemas deste abandono tácito de um projeto de desenvolvimento sustentável têm feito outras vítimas além dos pescadores da Baía de Sepetiba. Um estudo recentemente finalizado por pesquisadores do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense mostrou que os índices de poluição (especialmente a atmosférica) na região metropolitana atingiram níveis preocupantes, especialmente naquelas regiões ocupadas pela população mais pobre.
Apesar de toda esta situação adversa, as organizações ambientalistas estão se preparando para realizar uma agenda paralela durante a Rio +20, buscando oferecer uma arena alternativa que oriente todos os segmentos que estão se confrontando com os efeitos negativos do retrocesso da agenda ambiental dos governos nacionais. Pode não parecer muito, mas já é um bom começo.