segunda-feira, 13 de junho de 2011


Brasil prepara alteração de leis para o Mundial de 2014

Mudança mais polêmica é a liberação para o consumo de bebidas alcoólicas dentro dos estádios. Anteprojeto tem cerca de 40 novas regras
10/06/2011 | 00:11 | Themys Cabral


Construir estádios e adequar a infraestrutura das cidades não são os dois únicos desafios que o Brasil enfrenta para sediar a Copa do Mundo em 2014. Exigências da Federação Internacional de Fute bol (Fifa) obrigam o país a fazer alterações temporárias na legislação. De acordo com o Ministério dos Esportes, uma Lei Geral da Copa deve ser enviada nas próximas semanas para o Congresso Nacional a fim de atender as garantias dadas à Fifa. O anteprojeto de lei, que traz cerca de 40 regras para a organização da competição, está em análise na Casa Civil.
As novas regras vão desde mudanças temporárias na concessão de visto para estrangeiros à proteção de marcas ligadas ao evento. Em entrevista à Agência Brasil, o ministro dos Esportes, Orlando Silva, disse não esperar dificuldades no Congresso. Ele espera que a lei entre em vigor até o dia 30 de julho, quando serão sorteados os grupos da primeira fase. Onze ministérios se envolveram da elaboração da nova norma.
As mudanças
Veja as alterações legislativas necessárias para a Copa de 2014:
Entrada de materiais
Isenção de tributos incidentes sobre atividades vinculadas à organização da competição e nas importações de bens ou mercadorias para uso ou consumo na organização e realização do evento.
Visto
Facilidade na obtenção do visto de turista e de trabalho, quando estiver relacionado à Copa. Estuda-se a possibilidade de as pessoas envolvidas nos eventos terem o direito de entrar no país apenas com a apresentação do passaporte válido para o período e a credencial do evento. O Ministério das Relações Exteriores e os comitês organizadores montarão operações especiais nos aeroportos para a alfândega e liberação de bagagem.
Vias urbanas
Faixas exclusivas nas cidades-sede para o transporte dos envolvidos nos eventos, como dirigentes e delegações, para evitar que o trânsito das grandes cidades atrase o início das competições.
Bebida
Liberação da venda de bebidas alcoólicas nos estádios. A cerveja Budweiser é patrocinadora do evento.
Publicidade e comércio
Em um raio de dois quilômetros ao redor dos locais das competições, apenas os patrocinadores e empresas envolvidas poderão expor suas marcas e comercializar seus produtos.
Penas aos infratores
Deverão ser criados juizados e delegacias dentro dos estádios para que os casos sejam resolvidos na mesma hora.
Cadeira cativa
Os proprietários de cadeiras cativas nos estádios privados perderão o seu direito de uso exclusivo dos assentos durante o evento.
Proteção às marcas
Criação de regras para apressar o registro de patentes de produtos com a marca do campeonato, regras de proteção à propriedade intelectual, aos símbolos da Copa e de combate à pirataria.
Segundo o consultor jurídico do Ministério dos Esportes, Wladimir Camargos, a Lei Geral da Copa será uma norma com vigência temporária, com prazo para terminar após a competição. Ainda não se sabe se o anteprojeto será apresentado ao Congresso como medida provisória ou projeto de lei. Como o documento ainda está sob análise da Casa Civil, seu conteúdo não foi divulgado. Com base nas exigências feitas pela Fifa, porém, já é possível adiantar alguns pontos (veja ao lado).
Isenção e bebida
O único assunto de competência do governo federal que ficou de fora da lei é o relativo à isenção tributária. O tema, tratado na lei 12.350, sancionada no fim do ano passado, estipula isenção de tributos federais incidentes sobre atividades vinculadas à organização da competição e nas importações de bens ou mercadorias para uso ou consumo na organização e na realização do evento. Sobra, ainda, para estados e municípios legislar sobre isenção tributária dentro de sua esfera de competência. “Na Lei Geral da Copa pode haver previsões gerais, mas há assuntos que vão depender dos estados e municípios”, diz Camargos.
Caberá a estados e municípios também legislar sobre a liberação da venda de bebida alcoólica nos estádios. “A venda de bebida no estádio vai ter de ser liberada. Não tem jeito. A [cerveja] Budweiser é patrocinadora do evento. A legislação municipal terá de ser alterada”, admitiu o secretário para Assuntos da Copa no Paraná, Mário Celso Cunha. Segundo o secretário Municipal Extraordinário da Copa 2014, Luiz de Carvalho, o assunto está sendo estudado. “Esperamos a lei nacional para balizar o que for necessário complementar”, diz Cunha. Carvalho lembra que, em Curitiba e no Paraná, leis para atender exigência em relação à isenção de impostos já foram feitas.
Soberania
Para Camargos, ceder às exigências da Fifa não afeta a soberania do país. “Foi vontade do Brasil assinar as garantias à Fifa. Não fazemos [mudanças] porque a Fifa impõe, mas porque achamos justo para ter um evento melhor”, diz. Ele lembra que a Fifa chegou a exigir uma mudança na Lei Pelé, para que apenas as emissoras com direito de transmissão pudessem divulgar imagens das partidas, o que não será atendido. “Para fins jornalísticos, nossa lei prevê a possibilidade de divulgação de até 3% [da partida] sem pagar. Já era nossa tradição jurídica e a Fifa entendeu.”
Para o advogado e professor de Relações Internacionais do UniCuritiba Rodrigo Araújo Gabardo, como o país aderiu e sabia das condições para receber o evento, não há de se falar em soberania ferida. Já para o presidente da Comissão de Direito e Mun dialização da Ordem dos Advo gados de São Paulo (OAB-SP), Eduardo Carvalho Tess Filho, condicionar a realização da competição às mudanças não fere a soberania, mas é uma intervenção indevida. “Essa interferência de uma instituição privada, com interesses privados, é inadmissível. O lobby não poderia influenciar a discussão no Congresso.”
Segundo o especialista, o problema é ainda mais grave se a lei for feita por meio de medida provisória. “É passar o rolo compressor. É decidir questões importantes para o país de cima para baixo, por causa da Copa, beneficiando grupos isolados.” Gabardo também considera ilógica uma mudança temporária na legislação e somente para a Copa. “Se eu posso gerar benefícios fiscais, por que não posso gerar para outras atividades? Por que liberar venda de bebida alcoólica nos estádios só durante o evento? É ilógico liberar para uma partida de futebol entre dois países, mas não entre dois times de Curitiba, por exemplo.”
Fonte: www.gazetadopovo.com.br