quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

GOVERNO CABRAL E GRUPO EBX NÃO FORAM, MAS AGRICULTORES DO V DISTRITO REALIZAM AUDIÊNCIA POPULAR SOBRE O COMPLEXO DO AÇU

Apesar de terem sido convidados, os representantes dos diferentes órgãos do governo do Rio de Janeiro e das empresas ligadas ao Grupo EBX, do bilionário Eike Batista, não compareceram à audiência pela Associação dos Produtores Rurais e Imóveis de São João da Barra (Asprim) para discutir os graves impactos sociais e ambientais que estão sendo causados pelo Complexo Portuário Industrial do Açu.

Esta ausência do governo Cabral e do Grupo EBX apenas evidenciam a falta de compromisso com um debate minimamente democrático sobre a implantação de um complexo portuário-industrial cujas consequências estão sendo subestimadas em nome de um pseudo projeto de desenvolvimento econômico.

Em que pesem esta fuga, a audiência reuniu centenas de produtores e apoiadores de diferentes organizações sociais que apoiam a luta em defesa da agricultura familiar no V Distrito de Sâo João da Barra.  As lideranças da ASPRIM acreditam que essa assembléia representa uma virada no processo de organização dos que querem resistir para permanecer nas suas terras produzindo alimentos e mantendo uma cultura centenária que se encontra sob grave ameaça pela intransigência e truculência.

Produtores rurais promovem audiência sobre distrito industrial e porto no Açu



A Associação dos Produtores Rurais e Imóveis de São João da Barra (Asprim) promoverá no dia 26 de janeiro, às 14 horas, uma audiência pública em sua sede, situada na RJ - 240 s/n em Campo da Praia, no 5º Distrito, para debater o licenciamento ambiental e desapropriações destinadas à instalação do Terminal portuário e do Distrito Industrial do Açú, um mega empreendimento que trará conseqüências para toda a região compreendida entre os municípios de São Francisco do Itabapoana e Macaé.

De acordo com o vice-presidente da Asprim, Rodrigo Santos Silva, o debate visa proporcionar o esclarecimento diante das comunidades afetadas e sobre a amplitude dos impactos ambientais e sociais envolvidos no empreendimento, possibilitando a formulação de perguntas aos empreendedores e órgãos envolvidos.

Além da comunidade local, do entorno do município de São João da Barra e de cidadãos dos demais municípios da região interessados na questão socioambiental, serão convidados a compor a mesa de debates os diretores da LLX, OSX e OGX, o Conselho de Sustentabilidade das referidas empresas, os diretores das empresas de consultoria ambiental contratadas e o Ministério Público Federal.

Também serão convidados o Presidente do Instituto Nacional do Ambiente - INEA e equipe técnica, assim como o governador do Estado do Rio de Janeiro e o presidente do Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro - CODIN, empresa de economia mista também responsável pelas desapropriações dos imóveis rurais.

Ontem, foi realizada a Carreata Ecumênica de apoio ao Movimento Açu em Ação, com a presença de aproximadamente 200 pessoas. De acordo com Rodrigo, o evento foi em defesa da agricultura familiar e sua cultura, pelo direito de permanecer na terra, pela restinga, pelos animais de todas as espécies, pela segurança das famílias, pela qualidade de vida desta e das futuras gerações. “Vale a pena trocarmos tudo isso por um desenvolvimento que só traz benefícios para alguns poucos?”, indagou o vice-presidente da Asprim.

O Superporto do Açu é um Complexo Portuário Privativo de Uso Misto, com dois terminais, um offshore e outro onshore, em construção em São João da Barra, sendo o maior investimento em infraestrutura portuária da América Latina, com 17 km de píer e até 40 berços de atracação de navios.

Atualmente, mais de 2 mil pessoas trabalham nas obras do superporto. O empreendimento, com área de 130 km2, terá um Complexo Industrial contíguo para a instalação de indústrias, com atração de investimentos previstos de US$ 40 bilhões. A previsão de início de operação do Superporto do Açu é para o final de 2012.

A Associação dos Geógrafos Brasileiros - seção Rio/Niterói - elaborou um minucioso trabalho crítico sobre o Relatório de Impacto Ambiental do Complexo Industrial-Portuário do Açu (CIPA), distribuído na Assembléia Legislativa, no Congresso Nacional, nos meios acadêmicos e para representantes do terceiro setor. Este relatório de 57 páginas contesta os argumentos utilizados pelos principais atores - empresa, prefeitura de São João da Barra e governo do Estado - e o próprio conceito de desenvolvimento insustentável que dominou o país - e ainda domina em algumas regiões - por várias décadas.

Nas considerações finais, o relatório da AGB é enfático: “A imagem que se cria dos grandes projetos produz expectativas na população em torno da geração de empregos e renda. Entretanto, a história dos mega empreendimentos no Brasil (Carajás, Tucuruí...) mostra que, de uma maneira geral, estes pouco beneficiam a população local, constituindo-se meramente em fonte de lucros para corporações nacionais e estrangeiras e, praticamente, nenhum benefício para os moradores do entorno. Ao contrário, o que tende a prevalecer são os impactos negativos para esta população”.

De acordo com a AGB, “os impactos diretos e indiretos da construção do CIPA incluem danos à pesca, expulsão de trabalhadores da terra, assoreamento de lagoas e rios, especulação imobiliária e redução da produção agropecuária. A construção da ponte de acesso ao píer do terminal portuário já vem gerando impactos sobre a pesca, ao impedir que os pescadores locais atravessem por baixo da ponte até a Lagoa de Iquipari, onde eles tradicionalmente pescam peixes e camarões”.

Diz o relatório da AGB que “um outro tipo de impacto diz respeito à poluição atmosférica gerada pelas indústrias e pelas usinas termoelétricas a serem instaladas no complexo. A qualidade do ar será fortemente alterada pelo conjunto das emissões, cujos valores não foram considerados nos RIMAs disponíveis à população, tampouco contabilizados em seu conjunto”.

Além dos impactos ambientais que ameaçam várias espécies endêmicas, o vice-presidente da Asprim, Rodrigo Santos Silva, lembra dos problemas sociais que serão gerados. “A justificativa da prefeitura, do governo do estado e da EBX para a implantação do CIPA no 5º distrito é a localização e aproveitamento das potencialidades locais e regionais, além da pouca aptidão agrícola, devido às características físicas dos solos.

Eles vêm aqui, numa área que sempre teve como característica a pesca e a agricultura, e têm a ‘cara-de-pau’ de dizer que nossas terras são improdutivas. Nos estranha ouvir isso quando produzimos mensalmente 300 toneladas de maxixe e quiabo, além de ter a segunda maior produção de abacaxi do estado, com 4,6 milhões de unidades anuais”, falou Rodrigo.

Ele ressaltou que a cadeia produtiva da agricultura gera 15 mil empregos diretos, e o empreendimento poderá afetar o abastecimento agrícola em todo o Estado do Rio de Janeiro.

Rodrigo ainda aponta irregularidades no processo de desapropriação e realocação das famílias que estão sendo atingidas. “A avaliação que eles fazem sobre o valor das terras e benfeitorias são feitas em papel de pão em um ato de total desrespeito com o agricultor. Muitos já foram desapropriados, mas ainda não receberam suas indenizações”, falou Rodrigo, ressaltando que a EBX ainda não possui a documentação da Fazenda Palacete, local para onde as famílias estão sendo levadas. “Esta é uma área arrendada que ainda está na justiça.

Ou seja, estamos sendo retirados de nossas terras para sermos transferidos para um local que não é nosso e onde nosso futuro será incerto. Não somos contra o Porto e nem contra o desenvolvimento, mas queremos ter o direito de produzir em nossas terras, conseguidas com muito trabalho e suor. Nós não vamos ceder, pois nossa cultura e nossa vida estão dentro do 5º distrito”.